terça-feira, 15 de maio de 2012

Providências Cautelares no Direito Administrativo Parte II


   Providencias Cautelares no Direito Administrativo Parte II analisa as principais particularidades do regime das providências cautelares no âmbito do contencioso administrativo. A sistematização deste texto é a seguinte:

- 5.Decretamento Provisório da Providência
- 6.Convolação do Processo Principal em Providencia Cautelar
- 7.Articulação entre os Artigos 109º e 131º do CPTA
5.      Decretamento Provisório da Providência

   Antes de mais cabe esclarecer que este regime é aplicável a qualquer providência em situação de especial urgência, salvo nos casos em que esteja em causa a suspensão da eficácia de um acto administrativo ou de uma norma regulamentar, em que se aplica sempre o regime especial da proibição de execução previsto no art.º 128 do CPTA.

   Sendo o Tribunal confrontado com uma situação em que seria adequado o decretamento de uma providência cautelar provisória, poderá o Juiz decretar a providência oficiosamente? Ou por outro lado, para que esta seja decretada é necessário o requerimento?

   Entende o Professor VIEIRA DE ANDRADE que se deve atender ao principio da tutela efectiva, ainda que apenas nos casos em que esteja em causa a lesão eminente de direitos, liberdades e garantias, e que o Juiz deve poder decretar provisoriamente a providência requerida ou outra que julgue mais adequada, ainda que o decretamento provisório não tenha sido requerido, tudo isto apesar da falta de clareza do art.º 131 nº3 do CPTA.
  
   Parece-nos que a hipótese de o Juiz decretar provisoriamente e oficiosamente uma providência cautelar não se deve cingir aos casos em que podem ser afectados direitos, liberdades e garantias. Sem entrarmos na discussão sobre o que são afinal direitos, liberdades e garantias, ou se deve haver uma distinção entre estes e direitos económicos, sociais e culturais, cremos que é possível ir mais longe.  Desde logo ao abrigo dos princípios da cooperação das partes (art.º 8º CPTA), este assegura que os interventores no processo (magistrados, mandatários judiciais e partes) actuem de forma coordenada a justa composição do litígio de forma breve e eficaz. Ora se a normal tramitação de um requerimento para o decretamento de uma providência cautelar demorar, suponhamos dois meses, e o objecto merecedor de tutela jurídica se perder durante este lapso temporal, resultando a decisão de mérito da lide principal, numa mera decisão platónica, sem qualquer utilidade para o interessado, então o juiz deverá ao abrigo do principio da cooperação, sob pena de que o processo seja ineficaz, decretar provisoriamente uma providência cautelar, de forma a proteger o interesse daquela parte. Note-se que este decretamento tem como requisito a lesão eminente de um interesse jurídico.

   O princípio da economia processual pode também justificar o decretamento provisório de uma providência cautelar. Pense-se na hipótese de um determinado bem jurídico não ser protegido, e de uma acção intentada para o proteger ser proferida mais tarde, sendo favorável ao autor, este teria em mãos uma já referida decisão de mérito platónica, o Tribunal deu-lhe razão porém o autor não retira dali qualquer utilidade. Restaria àquela parte, por hipótese, intentar uma acção de indemnização pela destruição daquele bem jurídico. Ora ao actuar de imediato, decretando oficiosamente e a título provisório uma providência cautelar o Tribunal estaria desde logo a obstar ao proferimento de uma sentença inútil, assim como a poupar a parte lesada de vir a intentar uma nova acção num futuro próximo de forma a obter alguma utilidade do Direito.

   Podemos também aqui elencar o princípio da celeridade processual segundo o qual a duração do processo não deve por em causa a realização efectiva da justiça material, podendo assim as partes recorrerem a métodos que assegurem o efeito útil das sentenças. Este princípio está consagrado na Lei Fundamental art.º 20º nº4 e 5 da CRP.

   Em suma, desde que se verifique o requisito da lesão eminente de um bem jurídico, assim como os restantes requisitos para o proferimento de uma providencia cautelar, adaptados ao prazo especialmente curto de 48 horas que exige o art.º 131º do CPTA, deve o Tribunal proferir oficiosamente uma providencia cautelar, de forma a que a decisão de mérito resultante da lide principal possa ter alguma utilidade.

   Como escreve VIEIRA DE ANDRADE o periculum in mora, nestes casos, reporta-se ao retardamento do próprio processo cautelar, visa-se evitar a lesão permanente e irreversível.

   O Professor diz-nos ainda que tratando-se de uma decisão cautelar provisória seria possível dispensar os critérios estabelecidos no art.º 120º do CPTA. Salvo o devido respeito, não vamos tão longe, parece-nos que neste caso deve ser feita uma interpretação teleológica do art.º 120º do CPTA conjugado com à ratio do art.º 131º do mesmo Código. Ou seja devemos verificar os requisitos do art.º120 do CPTA porém atendendo ao especial contexto de urgência que o art.º131º do CPTA nos exige, de forma menos exigente do que seria de esperar numa providência cautelar “normal”. Daqui resulta que apesar de estarmos no âmbito de uma destruição eminente e irreparável de um bem jurídico, se não estiverem preenchidos os requisitos do art.º120 do CPTA, ainda que na sua forma mais lata, não deve o Juiz decretar oficiosamente e a título provisório a providência cautelar.

   Leia-se que a decisão cautelar que resultar deste processo vai mais tarde ser revista nos termos da normal tramitação de uma providência cautelar. O professor VIEIRA DE ANDRADE admite que o juiz possa proferir uma decisão cautelar definitiva, tendo no entanto, neste caso, que respeitar os critérios de aplicação do art.º 120º do CPTA.

6.      Convolação do Processo Cautelar em Processo Principal

   A convolação do processo cautelar em processo principal consiste na possibilidade de o Tribunal antecipar, definitivamente, no processo cautelar, a decisão sobre o mérito da causa, como que convolando a tutela cautelar em tutela final urgente, nas situações limite em que, por manifesta urgência na resolução definitiva do caso, mormente por alteração das circunstâncias de facto, se não compadeça, aquele, com o mero decretamento provisório da providência requerida.[1]

   A convolação do processo cautelar em processo principal está prevista no art.º 121º do CPTA. São requisitos de aplicação do art.º 121º nº 1 do CPTA:

- Que seja manifesta a urgência na resolução definitiva do caso

- Que seja possível concluir que a situação não se compadece com o decretamento de uma simples providência cautelar

- Que tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito

- Que as partes sejam ouvidas pelo prazo de 10 dias

   O art.º 121º nº2 do CPTA estatui que a decisão de antecipar o juízo sobre a causa principal é passível de impugnação.

   O Professor VIEIRA DE ANDRADE defende que a convolação do processo cautelar em processo principal deve ser uma situação excecional. Desde logo pelos apertados requisitos que é necessário preencher para a aplicação do art.º 121º do CPTA, mas também pelo número reduzido de casos que são aptos a preencher estes requisitos, a impossibilidade de a estes se aplicar uma providência cautelar, e exigirem com urgência uma decisão de mérito.

7.      Articulação entre os Artigos 109º e 131º do CPTA

   A intimação, prevista no art.º 109º do CPTA, tem uma Natureza subsidiaria, segundo JOANA SOUSA resulta deste preceito que a necessidade de intimação urgente, sob a forma de decisão definitiva, afere-se pela impossibilidade ou insuficiência da intimação urgentíssima provisória, regulada no art.º 131º do CPTA, sob a forma de decisão cautelar.

   Do exposto resulta que a intimação não é um meio normal, só recorremos a esta quando demonstrada a impossibilidade de aplicar um outro meio. O meio normal para a defesa dos Direitos Fundamentais são as acções administrativas comuns ou especiais, associadas eventualmente à dedução de um pedido de decretamento de providências cautelares, destinadas a assegurar a utilidade da sentença.

   Assim deve ser conferida prioridade aos processos não urgentes, já que como vimos a intimação tem um caracter excecional. É esta subsidiariedade aplicável apenas às providências cautelares genéricas ou é a intimação subsidiária a todas as providências cautelares orientadas para a defesa de direitos, liberdades e garantias?

   A Doutrina tem entendido que o nexo de subsidiariedade que descrevemos, se deve estender às providências cautelares específicas de protecção de direitos, liberdades e garantias.

   O recurso à intimação tem deste modo, como requisito de aplicação, a inexistência de qualquer outro meio processual especial de defesa de direitos, liberdades e garantias.

   O requerente terá ainda que alegar e provar que só a procedência do pedido de intimação lhe propiciará a plenitude do exercício do seu direito, demonstrando assim a indispensabilidade da intimação para o caso concreto. Note-se que a alegação e a prova devem ser produzidas de forma adaptada à especial urgência do processo em questão.

   A intimação é um processo urgente e principal, caracterizado por uma tramitação sumária e dirigido para a produção de uma sentença de mérito, ou seja, para a obtenção de uma sentença definitiva.

   Por outro lado, a providência cautelar do art.º 131 º do CPTA tem em vista a produção de uma sentença provisória, com caracter de urgência, cujo único fim é apenas salvaguardar o objecto de um processo e garantir a utilidade de uma futura sentença de mérito. É como já desenvolvemos, uma medida instrumental e provisória.

   Em comum têm os dois instrumentos o facto de ambos serem intentados, e uma decisão quanto a estes decretada no prazo de 48 horas.

   Por fim e ainda neste âmbito entendem alguns autores que caso seja intentada uma intimação, mas não se encontrem preenchidos os requisitos desta, deve o Juiz oficiosamente convolar o processo numa providência cautelar provisória se entender que esta é suficiente para as circunstâncias do caso, nos termos do art.º 131º do CPTA.

Bibliografia:
-MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o novo Processo Civil, LEX, 1997
-VASCO PEREIRA DA SILVA, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2ª edição, 2009
-JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa, Almedina, 11ª edição, 2011
-JORGE HENRIQUE SOARES RAMOS in “Processos Cautelares no (novo) Contencioso Administrativo”, 2005
-JOANA SOUSA in “O Contencioso Administrativo dos direitos, liberdades e garantias”, 2007
-ISABEL FONSECA, Os Processos Cautelares na Justiça Administrativa – Uma Parte da Categoria da Tutela Jurisdicional de Urgência, in “Temas e problemas de Processo Administrativo”, ICJP, 2ª edição, 2011




[1] JORGE HENRIQUE SOARES RAMOS in “Processos Cautelares no (novo) Contencioso Administrativo”, 2005

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