Providencias Cautelares
no Direito Administrativo Parte II analisa as principais particularidades do
regime das providências cautelares no âmbito do contencioso administrativo. A
sistematização deste texto é a seguinte:
- 5.Decretamento
Provisório da Providência
- 6.Convolação do
Processo Principal em Providencia Cautelar
- 7.Articulação entre
os Artigos 109º e 131º do CPTA
5. Decretamento Provisório da
Providência
Antes de mais cabe esclarecer que este
regime é aplicável a qualquer providência em situação de especial urgência,
salvo nos casos em que esteja em causa a suspensão da eficácia de um acto
administrativo ou de uma norma regulamentar, em que se aplica sempre o regime
especial da proibição de execução previsto no art.º 128 do CPTA.
Sendo o Tribunal confrontado com uma
situação em que seria adequado o decretamento de uma providência cautelar
provisória, poderá o Juiz decretar a providência oficiosamente? Ou por outro
lado, para que esta seja decretada é necessário o requerimento?
Entende o Professor VIEIRA DE ANDRADE que se
deve atender ao principio da tutela efectiva, ainda que apenas nos casos em que
esteja em causa a lesão eminente de direitos, liberdades e garantias, e que o
Juiz deve poder decretar provisoriamente a providência requerida ou outra que
julgue mais adequada, ainda que o decretamento provisório não tenha sido
requerido, tudo isto apesar da falta de clareza do art.º 131 nº3 do CPTA.
Parece-nos que a hipótese de o Juiz decretar
provisoriamente e oficiosamente uma providência cautelar não se deve cingir aos
casos em que podem ser afectados direitos, liberdades e garantias. Sem
entrarmos na discussão sobre o que são afinal direitos, liberdades e garantias,
ou se deve haver uma distinção entre estes e direitos económicos, sociais e
culturais, cremos que é possível ir mais longe.
Desde logo ao abrigo dos princípios da cooperação das partes (art.º 8º
CPTA), este assegura que os interventores no processo (magistrados, mandatários
judiciais e partes) actuem de forma coordenada a justa composição do litígio de
forma breve e eficaz. Ora se a normal tramitação de um requerimento para o
decretamento de uma providência cautelar demorar, suponhamos dois meses, e o
objecto merecedor de tutela jurídica se perder durante este lapso temporal,
resultando a decisão de mérito da lide principal, numa mera decisão platónica,
sem qualquer utilidade para o interessado, então o juiz deverá ao abrigo do
principio da cooperação, sob pena de que o processo seja ineficaz, decretar
provisoriamente uma providência cautelar, de forma a proteger o interesse
daquela parte. Note-se que este decretamento tem como requisito a lesão
eminente de um interesse jurídico.
O princípio da economia processual pode
também justificar o decretamento provisório de uma providência cautelar.
Pense-se na hipótese de um determinado bem jurídico não ser protegido, e de uma
acção intentada para o proteger ser proferida mais tarde, sendo favorável ao
autor, este teria em mãos uma já referida decisão de mérito platónica, o
Tribunal deu-lhe razão porém o autor não retira dali qualquer utilidade.
Restaria àquela parte, por hipótese, intentar uma acção de indemnização pela
destruição daquele bem jurídico. Ora ao actuar de imediato, decretando
oficiosamente e a título provisório uma providência cautelar o Tribunal estaria
desde logo a obstar ao proferimento de uma sentença inútil, assim como a poupar
a parte lesada de vir a intentar uma nova acção num futuro próximo de forma a
obter alguma utilidade do Direito.
Podemos também aqui elencar o princípio da
celeridade processual segundo o qual a duração do processo não deve por em
causa a realização efectiva da justiça material, podendo assim as partes
recorrerem a métodos que assegurem o efeito útil das sentenças. Este princípio
está consagrado na Lei Fundamental art.º 20º nº4 e 5 da CRP.
Em suma, desde que se verifique o requisito
da lesão eminente de um bem jurídico, assim como os restantes requisitos para o
proferimento de uma providencia cautelar, adaptados ao prazo especialmente
curto de 48 horas que exige o art.º 131º do CPTA, deve o Tribunal proferir
oficiosamente uma providencia cautelar, de forma a que a decisão de mérito
resultante da lide principal possa ter alguma utilidade.
Como escreve VIEIRA DE ANDRADE o periculum in mora, nestes casos,
reporta-se ao retardamento do próprio processo cautelar, visa-se evitar a lesão
permanente e irreversível.
O Professor diz-nos ainda que tratando-se de
uma decisão cautelar provisória seria possível dispensar os critérios
estabelecidos no art.º 120º do CPTA. Salvo o devido respeito, não vamos tão
longe, parece-nos que neste caso deve ser feita uma interpretação teleológica
do art.º 120º do CPTA conjugado com à ratio
do art.º 131º do mesmo Código. Ou seja devemos verificar os requisitos do
art.º120 do CPTA porém atendendo ao especial contexto de urgência que o
art.º131º do CPTA nos exige, de forma menos exigente do que seria de esperar
numa providência cautelar “normal”. Daqui resulta que apesar de estarmos no
âmbito de uma destruição eminente e irreparável de um bem jurídico, se não
estiverem preenchidos os requisitos do art.º120 do CPTA, ainda que na sua forma
mais lata, não deve o Juiz decretar oficiosamente e a título provisório a
providência cautelar.
Leia-se que a decisão cautelar que resultar
deste processo vai mais tarde ser revista nos termos da normal tramitação de
uma providência cautelar. O professor VIEIRA DE ANDRADE admite que o juiz possa
proferir uma decisão cautelar definitiva, tendo no entanto, neste caso, que
respeitar os critérios de aplicação do art.º 120º do CPTA.
6. Convolação do Processo Cautelar em
Processo Principal
A convolação do
processo cautelar em processo principal consiste na possibilidade de o Tribunal
antecipar, definitivamente, no processo cautelar, a decisão sobre o mérito da
causa, como que convolando a tutela cautelar em tutela final urgente, nas
situações limite em que, por manifesta urgência na resolução definitiva do
caso, mormente por alteração das circunstâncias de facto, se não compadeça,
aquele, com o mero decretamento provisório da providência requerida.[1]
A convolação do processo cautelar em
processo principal está prevista no art.º 121º do CPTA. São requisitos de
aplicação do art.º 121º nº 1 do CPTA:
- Que seja manifesta a
urgência na resolução definitiva do caso
- Que seja possível
concluir que a situação não se compadece com o decretamento de uma simples
providência cautelar
- Que tenham sido
trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito
- Que as partes sejam
ouvidas pelo prazo de 10 dias
O art.º 121º nº2 do CPTA estatui que a
decisão de antecipar o juízo sobre a causa principal é passível de impugnação.
O Professor VIEIRA DE ANDRADE defende que a
convolação do processo cautelar em processo principal deve ser uma situação
excecional. Desde logo pelos apertados requisitos que é necessário preencher
para a aplicação do art.º 121º do CPTA, mas também pelo número reduzido de
casos que são aptos a preencher estes requisitos, a impossibilidade de a estes
se aplicar uma providência cautelar, e exigirem com urgência uma decisão de
mérito.
7. Articulação entre os Artigos 109º e
131º do CPTA
A intimação, prevista
no art.º 109º do CPTA, tem uma Natureza subsidiaria, segundo JOANA SOUSA
resulta deste preceito que a necessidade de intimação urgente, sob a forma de
decisão definitiva, afere-se pela impossibilidade ou insuficiência da intimação
urgentíssima provisória, regulada no art.º 131º do CPTA, sob a forma de decisão
cautelar.
Do exposto resulta que a intimação não é um
meio normal, só recorremos a esta quando demonstrada a impossibilidade de
aplicar um outro meio. O meio normal para a defesa dos Direitos Fundamentais
são as acções administrativas comuns ou especiais, associadas eventualmente à dedução
de um pedido de decretamento de providências cautelares, destinadas a assegurar
a utilidade da sentença.
Assim deve ser conferida prioridade aos
processos não urgentes, já que como vimos a intimação tem um caracter
excecional. É esta subsidiariedade aplicável apenas às providências cautelares
genéricas ou é a intimação subsidiária a todas as providências cautelares
orientadas para a defesa de direitos, liberdades e garantias?
A Doutrina tem entendido que o nexo de
subsidiariedade que descrevemos, se deve estender às providências cautelares
específicas de protecção de direitos, liberdades e garantias.
O recurso à intimação tem deste modo, como
requisito de aplicação, a inexistência de qualquer outro meio processual
especial de defesa de direitos, liberdades e garantias.
O requerente terá ainda que alegar e provar
que só a procedência do pedido de intimação lhe propiciará a plenitude do
exercício do seu direito, demonstrando assim a indispensabilidade da intimação
para o caso concreto. Note-se que a alegação e a prova devem ser produzidas de
forma adaptada à especial urgência do processo em questão.
A
intimação é um processo urgente e principal, caracterizado por uma tramitação
sumária e dirigido para a produção de uma sentença de mérito, ou seja, para a
obtenção de uma sentença definitiva.
Por outro lado, a providência cautelar do
art.º 131 º do CPTA tem em vista a produção de uma sentença provisória, com
caracter de urgência, cujo único fim é apenas salvaguardar o objecto de um
processo e garantir a utilidade de uma futura sentença de mérito. É como já
desenvolvemos, uma medida instrumental e provisória.
Em comum têm os dois instrumentos o facto de
ambos serem intentados, e uma decisão quanto a estes decretada no prazo de 48
horas.
Por fim e ainda neste âmbito entendem alguns
autores que caso seja intentada uma intimação, mas não se encontrem preenchidos
os requisitos desta, deve o Juiz oficiosamente convolar o processo numa
providência cautelar provisória se entender que esta é suficiente para as
circunstâncias do caso, nos termos do art.º 131º do CPTA.
Bibliografia:
-MIGUEL
TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o novo
Processo Civil, LEX, 1997
-VASCO
PEREIRA DA SILVA, O Contencioso
Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2ª edição, 2009
-JOSÉ
CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça
Administrativa, Almedina, 11ª edição, 2011
-JORGE
HENRIQUE SOARES RAMOS in “Processos
Cautelares no (novo) Contencioso Administrativo”, 2005
-JOANA SOUSA in “O Contencioso Administrativo dos direitos, liberdades
e garantias”, 2007
-ISABEL FONSECA, Os Processos Cautelares na Justiça
Administrativa – Uma Parte da Categoria da Tutela Jurisdicional de Urgência,
in “Temas e problemas de Processo
Administrativo”, ICJP, 2ª edição, 2011
[1]
JORGE
HENRIQUE SOARES RAMOS in “Processos
Cautelares no (novo) Contencioso Administrativo”, 2005
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