segunda-feira, 21 de maio de 2012

Extensão dos efeitos da sentença

 
Dispõe o artigo 161º n,º1 do CPTA que a extensão pode ser pedida relativamente aos efeitos de sentenças que tenham reconhecido uma situação jurídica favorável (em regra, no domínio da acção administrativa comum) ou anulado um acto administrativo desfavorável (no domínio da acção administrativa especial)

A extensão pode beneficiar outras pessoas, que se encontrem na mesma situação jurídica, quer tenham recorrido ou não à via judicial – desde que não haja sentença transitada em julgado quanto às pessoas que recorreram -, a não ser que haja contra-interessados, caso em que só é admissível quando estes tenham recorrido em momento próprio à via judicial e esteja pendente o processo correspondente (n.º5 do referido artigo).

Impõe-se ainda, tal como resulta do n.º2, que estejam em causa vários casos perfeitamente idênticos (o que sucede, por exemplo, perante um acto plural), nomeadamente no domínio do funcionalismo público e no âmbito de concursos. Segundo o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 12/05/2011 (Processo n.º 07383/11), a expressão legal “casos perfeitamente idênticos” não significa uma igualdade absoluta. Reporta-se a uma identidade de casos em termos de situação fáctica relevante e da sua qualificação e tratamento jurídicos, e não em termos de uma rigorosa coincidência quanto a todos os elementos de facto, mesmo que juridicamente irrelevantes.

Poder-se-à ver no presente artigo uma violação da confiança que a Administração deve poder pôr na estabilidade das relações jurídicas e ainda uma violação da igualdade, na medida em que traduz “um favor dos que, perante um acto desfavorável, permaneceram passivos e não reagiram judicialmente dentro do prazo legal, tratando-os de forma desigual face àqueles que, dentro do prazo de que dispunham, tiveram que mobilizar os meios processuais adequados.” (Cfr. Ac. 13 de Novembro de 2007, o Pleno da 1.ª Secção do STA).

Segundo VIEIRA DE ANDRADE, à possibilidade de extensão de efeitos da sentença anulatória de actos administrativos a quem não tenha lançado mão da via judicial no momento próprio há que reconhecer que tal “pode fragilizar a estabilidade do caso decidido”. Não seria descabido exigir “uma prova da diligência processual ou, pelo menos, da boa fé dos beneficiados”. O Tribunal Constitucional já foi chamado a pronunciar-se sobre este artigo seguindo o entendimento de que, se é certo que a eficácia de um acto administrativo inimpugnável – e que portanto gozava de alguma estabilidade na ordem jurídica – pode vir a ser inutilizada, por aplicação do artigo 161.º do CPTA, essa destruição dos efeitos, não obstante o «caso decidido», não significa uma intolerável quebra da confiança na estabilidade das relações jurídicas inerente a um Estado de Direito. (Cfr. Ac. do TC de 2/07/08). O que se pretende com este regime é, então, alcançar um tratamento substancialmente idêntico para situações substancialmente idênticas, com sacrifício da relativa estabilidade de que, em regra, beneficiam os actos administrativos cujo prazo de impugnação já decorreu. Na mesma linha, Rui Machete também refere «que na delimitação do caso julgado anulatório de acto administrativo encontra se a ideia de que, sob pena de contradição insanável, o mesmo acto não pode ser, perante a mesma ordem jurídica, simultaneamente nulo para uns e válido para outros». Ou seja, adverte o autor, que haverá casos em que a estabilização dos efeitos de um acto consolidado seria uma pura contradição (o acto era e não era válido ao mesmo tempo).

Acrescente-se ainda que tem sido entendido pela doutrina que a extensão dos efeitos da sentença, sendo admissível apesar do decurso do prazo de impugnação do acto administrativo desfavorável (isto é: apesar da caducidade do correspondente direito de acção), já não é possível se dela resultar afectação das situações de prescrição substantiva, pois o artigo 161.º “não constitui causa de desaplicação dos prazos de prescrição que eventualmente haja para o exercício dos direitos substantivos que se pretendem fazer valer”.

Por outro lado, impõe-se que tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado, ou três sentenças, se proferidas em processos formalmente seleccionados nas situações de processos em massa, nos termos do artigo 48º. O que se pretende com esta exigência é assegurar que as extensões de efeitos se baseiem em orientações jurisprudenciais suficientemente consistentes.

A extensão é primeiro solicitada à Administração sendo que, apenas na falta de êxito da pretensão é que se solicita a extensão ao tribunal que tenha proferido a sentença. Seguem-se, então, os trâmites do processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos. A sentença então proferida é havida como uma sentença de mérito, susceptível de recurso, nos termos gerais.

Do que foi exposto resulta que, apesar da sua inserção sistemática no título do CPTA dedicado ao processo executivo, o artigo 161º tem, pois, natureza essencialmente substantiva, dizendo respeito, em primeira linha, “a relações que, no plano extrajudicial, se desenvolvem entre Administração e particulares, quando estes pretendam que ela proceda, em seu favor, à extensão dos efeitos de sentenças proferidas em benefício de outrem”, só assumindo alcance processual os n.ºs 4 e 6. 





BIBLIOGRAFIA:

- ANDRADE, José Carlos Vieira de, "A justiça Administrativa" (Lições), Almedina,
-ALMEIDA, Mario Aroso de, e CADILHA, Carlos Alberto Fernandes, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Coimbra,
-OLIVEIRA, Rodrigo Esteves de, “Processo executivo: algumas ques­tões”, em A Reforma da Justiça Administrativa, Boletim da Faculdade de Direito, Stvdia Ivri­dica, n.º  86, Coimbra, 2005,


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