De acordo com o disposto no artº
156, nº 2 do CPC, sentença é o acto pelo qual o juiz ( a quem cabe administrar
a justiça) decide a causa principal ou algum incidente que apresente a
estrutura de uma causa. Cabe aqui apreciar da extensão dos efeitos destas,
possibilidade que resulta do artº 161º do CPTA, modificado pela última vez pela
Lei nº 4-A/2003, de 19 de Fevereiro.
Reconhecia-se, tradicionalmente,
numa posição defendida por MARCELLO CAETANO[1],
que os efeitos de uma sentença anulatória seriam inter partes ou erga omnes
consoante o fundamento da anulação fosse subjectivo ou objectivo, por respeitar
a factos que só se verificassem no impugnante ou resultar de uma ilegalidade
objectiva, respectivamente.
No entanto surgiu uma nova figura
no Contencioso Administrativo: a da extensão dos efeitos de uma sentença, nos
termos do artº 161º, nº 1 do CPTA, que pode ser pedida quando tenha sido anulado
um acto administrativo desfavorável (numa acção administrativa especial) ou quando
se tenha reconhecido uma situação jurídica favorável (numa acção administrativa
comum). Refere-se quanto a esta possibilidade o facto de só se justificar esta
extensão se o fundamento for comum ou se se tratar de um acto plural. Assim,
referiu o Tribunal Constitucional que “(...)não competindo ao Tribunal Constitucional, nesta sede, tomar
partido sobre a interpretação tida por mais correcta da norma em causa, há que
considerar, como um dado da questão de inconstitucionalidade que cumpre
apreciar, que o entendimento sufragado pelo acórdão recorrido foi o de que o
instituto em causa não se circunscreve aos “actos plurais”, sendo aplicável face a actos
administrativos individuais, desde que, porém, se verifiquem os demais
requisitos elencados no preceito.” Ac.
TC Processo n.º 141/08, de 2 de
Julho de 2008.
Esta extensão pode beneficiar
aqueles que por se encontrarem na mesma situação jurídica e que tenham,
ou não, recorrido à via judicial, a menos que existam contra-interessados (nº
5) – caso em que o recurso à via judicial é necessário, prendendo-se esta
exigência com a necessidade de dar corpo ao Principio do Contraditório.
No entanto, esta admissão não
pode ser entendida como passível de ser realizada em qualquer caso, uma vez
que, como resulta do nº 2 do artº 161º do CPTA, tal só é permitida caso existam
processos em massa.
Cabe clarificar que, a extensão
dos efeitos da sentença só é válida quando existam vários casos
perfeitamente idênticos (casos de funcionalismo público e no âmbito de concursos
– o que, em nota comparatística, difere do que acontece em Espanha, onde é
admitida a extensão em matéria tributária e de funcionalismo), quando existam
cinco sentenças transitadas em julgado ou três sentenças proferidas em
processos seleccionados nas situações de processos em massa.
Para haver extensão, esta tem que
ser solicitada à Administração e, caso esta pretensão não proceda, ou decorra o
período de três meses sem que haja uma decisão daquela, ao tribunal que tenha
proferido a sentença, decorrendo a tramitação como um processo de execução de
sentenças de anulação de actos administrativos. Esta remissão deve-se ao facto
de as sentenças anulatórias terem uma dimensão declarativa. Como esclarece
VIEIRA DE ANDRADE[2], o
processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos não é um
verdadeiro processo executivo, não extraindo apenas as consequências materiais
de uma decisão anterior mas, antes, um processo cujas dimensões declarativas se
retiram do facto de a sentença conhecer a situação, produzindo ou concretizando
autonomamente efeitos condenatórios.
Tal sentença tem que ser
considerada como uma sentença de mérito e é susceptível de recurso – no caso de
o tribunal que proferiu a sentença ser um tribunal se 2ª Instância, não sendo o
tribunal normalmente competente para a sua execução, o prof. VIEIRA DE ANDRADE
considera ser, nesse caso, necessário fazer-se baixar o processo ao tribunal de
1ª Instância, para a execução quando se determine a extensão dos efeitos
daquela.
Para o mesmo autor, esta solução
legal levanta desde logo alguns problemas:
a) A
primeira prende-se com a necessidade de serem proferidas várias sentenças;
b) E,
mesmo quanto a estas, os efeitos podem ser estendidos aos restantes, a
requerimento dos interessados, imediatamente para efeitos de execução de
sentenças, como se retira da aplicação conjunta dos artº 48/5 e 176º, pelo que,
a exigência de três processos só pode valer para os que não tiverem tido o seu
processo suspenso;
c) Ainda,
pelo facto de podendo os efeitos ser estendidos aos que não recorreram à via
judicial, tal poderia colocar em causa a estabilidade do caso válido. VIEIRA DE
ANDRADE levanta aqui a questão de indagar se não seria pertinente exigir uma
prova, ainda que não fosse da diligência processual, pelo menos da boa fé dos
beneficiários (o que não chocará certamente, já que tal exigência de boa fé é
feita para a situação de execução de sentença que atinjam beneficiários de
actos consequentes dos actos anulados – artº 173, nº3 CPTA). Consideramos ser
aqui de referir uma decisão do Tribunal Constitucional relativamente à
constitucionalidade deste artigo, onde ser explana que “é
verdade que a eficácia de um acto administrativo inimpugnável – e que portanto
gozava de alguma estabilidade na ordem jurídica – pode vir a ser inutilizada,
por aplicação do artigo 161.º do CPTA. Mas essa destruição dos efeitos, não
obstante o «caso decidido», não significa uma intolerável quebra da confiança
na estabilidade das relações jurídicas inerente a um Estado de Direito.
O acórdão recorrido sublinhou, citando a propósito o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 17/84, que o cidadão deve «poder prever as intervenções que o Estado poderá levar sobre ele ou perante ele e preparar‑se para se adequar a elas. (…) Deve poder confiar em que a sua actuação seja reconhecida pela ordem jurídica e assim permaneça em todas as consequências juridicamente relevantes». Ora, a introdução na ordem jurídica do artigo 161.º do CPTA não é uma ruptura inesperada da irrelevância (em determinadas situações) do caso decidido. A lei, a doutrina e a jurisprudência desde sempre admitiram – como veremos – hipóteses em que o caso decidido não gozava de total protecção.” Ac. TC Processo n.º 141/08, de 2 de Julho de 2008.
O acórdão recorrido sublinhou, citando a propósito o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 17/84, que o cidadão deve «poder prever as intervenções que o Estado poderá levar sobre ele ou perante ele e preparar‑se para se adequar a elas. (…) Deve poder confiar em que a sua actuação seja reconhecida pela ordem jurídica e assim permaneça em todas as consequências juridicamente relevantes». Ora, a introdução na ordem jurídica do artigo 161.º do CPTA não é uma ruptura inesperada da irrelevância (em determinadas situações) do caso decidido. A lei, a doutrina e a jurisprudência desde sempre admitiram – como veremos – hipóteses em que o caso decidido não gozava de total protecção.” Ac. TC Processo n.º 141/08, de 2 de Julho de 2008.
Há uma possibilidade claramente
justificada de se estender os efeitos das sentenças aos que, quando não tenha
havido hipótese de coligação ou apensação de processos, tenham impugnado o
mesmo acto num outro processo.
Consideramos que, como nota
própria, e na medida em que um dos princípios relativos à prossecução processual
é o principio da economia e celeridade processual (pelo qual se define que o
processo deverá ser, tanto quanto possível, o mais eficiente e célere, devendo-se
evitar trâmites desnecessários ou demasiado complicados, ou até mesmo inúteis
ou dilátorios), este está subjacente à alteração do Código do Procedimento
Administrativo que resultou na previsão da extensão dos efeitos da sentença,
pelo que estando preenchidos os requisitos do artº 161 não se vê porque não
recorrer a esta possibilidade que conduzirá, em certa medida, ao
descongestionamento dos Tribunais Administrativos.
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