terça-feira, 22 de maio de 2012

Um breve olhar sobre o regime de execução de sentenças Administrativas


Um breve olhar sobre o regime de execução de sentenças Administrativas

O CPTA veio instituir um conjunto de medidas processuais de ordem executiva, que se destinam a garantir ao particular exequente a adequação ao plano dos factos do direito ditado pela decisão jurisdicional, ao contrário do que sucedia no regime anterior contido no Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 15 de Junho (em vigor até 2004), que não continha mecanismos eficazes de plena execução contra a Administração nem, em boa verdade, se tratava de um autónomo processo executivo, mas de um complementar processo declarativo.

Está em causa todo um conjunto novo de poderes atribuídos ao juiz administrativo ao abrigo dos quais este assegura a eficácia da decisão jurisdicional que proferiu, impondo a sua execução diante da autoridade condenada, quer por sua própria intervenção, quer substituindo-se à própria autoridade executada na realização da actividade conforme à decisão, quer ainda encarregando terceiros de assegurar a execução dessa mesma actividade de modo a dar cumprimento à decisão executada.

Como ensina Mário Aroso de Almeida, os processos executivos existem para obter do Tribunal a adopção das providências que concretizem, no plano dos factos, aquilo que foi juridicamente declarado pelo tribunal no processo declarativo (ou que consta de outro título que a lei reconhece como executivo), adequando os factos ao Direito, a situação que existe àquela que segundo as normas, deve existir.
Do artigo 157º resultam os Títulos executivos que podem servir de base a um processo executivo a intentar nos Tribunais administrativos
A este propósito, cabe referir o n.º 3 do artigo 3.º do CPTA, que institui que “os tribunais administrativos asseguram ainda a execução das suas sentenças (…) ”.

A disposição citada assume particular relevância no novo sistema do contencioso administrativo de execução de sentenças:

Em primeiro lugar, institui-se um verdadeiro processo administrativo executivo, no contexto de plena jurisdição executiva[1]: para além da execução de sentenças anulatórias, regulam-se as providências judiciais de execução de prestação de factos ou coisas, bem como de quantia certa.

 Em segundo lugar afirma-se o princípio da auto-suficiência executiva dos tribunais administrativos diante da Administração executada, isto é, estes passam a dispor de mecanismos ou instrumentos estruturalmente executivos necessários para garantir a produção dos efeitos práticos e jurídicos das suas sentenças declarativas e para compelir a Administração a respeitá-los. O preceito introduz, “pela primeira vez no nosso contencioso administrativo, verdadeiros processos executivos, que, assegurando aos interessados a execução das decisões de que sejam beneficiários, se concretizam num importantíssimo reforço dos poderes de que dispõem os tribunais administrativos, na medida em que lhes conferem o poder de executarem ou fazerem executar as decisões que proferem”[2].

Em terceiro, o preceito afirma, ainda, o princípio da completude ou plenitude da tutela executiva, autonomizando os poderes jurisdicionais executivos face aos poderes jurisdicionais declarativos dos tribunais administrativos, introduzindo poderes de intervenção jurisdicional estruturalmente adequados a todo o tipo de posições jurídicas subjectivas inscritas no âmbito de relações jurídicas administrativas, designadamente daquelas que não se satisfazem com uma intervenção de natureza declarativa.

O n.º 3 do artigo 3.º do CPTA, em conjugação com o princípio da tutela jurisdicional efectiva consagra, realmente, o direito à imposição coerciva das obrigações de conteúdo vinculado emergentes de sentença jurisdicional e o direito a autênticos meios processuais que permitam, em tempo útil obter a satisfação efectiva, no plano dos factos, das posições jurídicas violadas.

Deve, ainda, salientar-se que o legislador do novo regime de processo nos tribunais administrativos assumiu clara preferência pela tutela executiva restitutiva ou reconstitutiva em face da tutela executiva ressarcitória ou compensatória. O legislador, na óptica da maximização da protecção dos direitos e interesses legítimos do cidadão, optou por consagrar um conjunto de mecanismos vocacionados para a reconstituição natural do direito ou interesse violado pela actuação administrativa em detrimento dos meios de compensação por equivalente do beneficiário da sentença administrativa condenatória

O CPTA regula a matéria dos processos executivos no Título VIII, que compreende os artigos 157.º a 179.º. Em bom rigor, o CPTA só regula, as execuções promovidas contra entidades públicas. A execução das sentenças proferidas pelos tribunais Administrativos contra particulares também corre nos tribunais Administrativos, mas rege-se pelo disposto na lei processual civil (157.º nº2 CPTA). Entendendo, a este propósito, Mário Aroso de Almeida que o mesmo regime é aplicável, por identidade de razão, às execuções intentadas contra particulares com base em outros títulos executivos emergentes de relações jurídico - administrativas, cuja existência permita prescindir da obtenção de sentenças a proferir pelos tribunais administrativos.

O CPTA consagra neste enquadramento três formas de processo executivo: o processo de execução para prestação de factos ou de coisas (artigos 162.º a 169.º), o processo de execução para pagamento de quantia certa (artigos 170.º a172.º) e o processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos (artigos 173.º a179.º).

Nos artigos 157.º a 161.º, contempla o CPTA um conjunto de “Disposições gerais” comuns a todos os referidos processos executivos cuja regulamentação legal se inicia no artigo 162.º.

Em síntese, deve salientar-se quanto a estas disposições comuns:


·     A sentença administrativa adquire exequibilidade após o trânsito em julgado, sendo que a execução por parte da autoridade executada deve ocorrer a partir desse momento ou, no caso de interposição de recurso com efeito devolutivo, a partir do despacho de admissão do mesmo com fixação do requerido efeito, artigo 160.º do CPTA;

·       Tornou-se possível a extensão dos efeitos da sentença administrativa a terceiros que se encontrem na mesma situação jurídica, desde que no mesmo sentido tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado ou, existindo situações de processos em massa, nesse sentido tenham sido decididos em três casos os processos selecionados segundo o disposto no artigo 48.º - artigo 161.º do CPTA.

·         No 158.º reafirma a obrigatoriedade das decisões dos tribunais administrativos, retirando-se daqui o dever de cumprimento espontâneo das sentenças pela Administração, dentro de um prazo, salvo ocorrência de causa legítima de inexecução, que nos termos da lei, serão só a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público na execução da sentença.

Posto isto, cabe analisar os mecanismos estruturalmente executivos de que dispõe o juiz administrativo designadamente no que concerne à possibilidade de este se substituir à Administração faltosa e de nomear terceiros ao processo para assegurar a recomposição do «status quo ante»:

1. Em matéria de substituição judicial da Administração, a lei permite, não só a entrega judicial da coisa devida ao exequente como também a emissão de sentença destinada a produzir os efeitos do acto ilegalmente omitido - cfr. artigos 3.º, n.º 3, 157.º, n.º 4,164.º, n.º 4, 167.º, nºs. 5 e 6 e 179.º, n.º 5, do CPTA: quer num caso quer noutro, o incumprimento por parte da Administração executada da sentença condenatória motiva o poder judicial do juiz administrativo a intervir em sua substituição de modo a dar plena satisfação aos direitos e interesses legítimos do exequente;

2. Estando em causa a execução para prestação de facto fungível, os tribunais podem encarregar um terceiro para realizar a actuação material correspondente, a expensas da Administração inadimplemente – cfr. artigos 3.º, n.º 3, in fine, 164.º, n.º 4, b), 167.º, nºs. 3 a 5, 170.º, n.º 2, b) e 172.º, nºs. 4 a 6 e 179.º, n.º 6, a contrario, todos do CPTA.


Em suma, nesta sede da execução das suas sentenças, o juiz administrativo dispõe, não só do poder de ordenar à entidade pública condenada que adopte no plano dos factos as condutas necessárias ao restabelecimento da situação anterior à ilegalidade cometida e condenada, como também o poder de se substituir à própria Administração na prática dos actos necessários a essa reconstituição natural, como ainda, o poder de encarregar terceiros de assegurar o cumprimento da sentença exequenda.









Bibliografia:

ALMEIDA, MÁRIO AROSO DE, CADILHA, CARLOS FERNANDES, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005;

ALMEIDA, MÁRIO AROSO DE, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2010;

ANDRADE, VIEIRA DE, A Justiça Administrativa (Lições), Almedina, 11.ª Edição, 2011;

MACHETE, Rui CHANCERELLE DE, Execução de Sentenças administrativas”, Cadernos de Justiça Administrativa.




[1] Neste sentido, Rui CHANCERELLE DE MACHETE, Execução de Sentenças administrativas”, Cadernos de Justiça Administrativa nº 34, pág. 54 ss
[2] MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, p. 34.


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