Efeitos da sentença e eficácia do caso julgado no Contencioso
Administrativo
No âmbito do Direito Administrativo,
existem vários tipos de sentenças, nomeadamente as sentenças simplesmente
declarativas; as sentenças constitutivas – aquelas que produzem ou autorizam
uma alteração na ordem jurídica existente, criando, modificando ou extinguindo
uma relação ou situação jurídica, que para o Direito Administrativo, tem
especial importância quando a sentença determina a invalidade retroactiva de
actos de autoridade, concretos ou normativos que violam a lei ou um direito ou
interesse legalmente previsto); as sentenças condenatórias – hipóteses de
condenação que implica uma intimação de uma autoridade publica para a adopção
dou abstenção de comportamentos e, sobretudo, a de poder haver a condenação à
omissão ou à pratica de um acto administrativo devido; sentenças de provimento –
que podem combinar diversos efeitos desde o condenatório, declarativo ou
constitutivo, conforme a pretensão do autor e as circunstancias do caso,
permitido pela cumulação de pedidos (art. 4º e 47º CPTA); sentenças de execução.
Logo, podemos concluir, que tal como no
processo civil, a sentença é um título executivo que arroga o titular, o
direito de a fazer executar por meios legais disponíveis, neste caso, recorrer
aos tribunais administrativos para a executar, quer seja contra a AP (art. 153º
nº3 CPTA), quer seja contra o particular (art. 157º nº2 CPTA).
As sentenças têm
como características fundamentais, a sua obrigatoriedade e prevalência, nos
termos do art. 158º CPTA.
A primeira,
tendente à obrigatoriedade perante as entidades públicas e privadas e a
segunda, mostra a prevalência sobre as de quaisquer autoridades
administrativas, implicando a nulidade de qualquer acto administrativo que a
desrespeite.
Relativamente,
aos efeitos das sentenças administrativas, como o Prof. Oliveira Ascensão
ensina, os mesmo são considerados os resultados da aplicação de uma lei ou a
exteriorização da vontade através de um acto publico ou privado tutelada pela
lei.
Os efeitos
processuais da sentença administrativa, que se observam são: o caso julgado;
extinção da relação jurídica processual ou da instancia; possibilidade de execução,
se a sentença for condenatória e tiver transitado em julgado ou houver sido
objecto de recurso com efeito meramente devolutivo; esgotamento do poder
jurisdicional do juiz quanto à matéria decidida, no sentido em que o juiz não
pode alterar nem o sentido da decisão, nem nenhum dos seus fundamentos, ficando
vinculado à decisão proferida, entre outros.
Quanto ao caso
julgado, importa, antes de mais, proceder à sua definição. A doutrina define o
caso julgado sob duas formas: material ou formal. Quanto ao caso julgado
material questiona-se qual o seu âmbito ( se inclui apenas a decisão, ou
igualmente os fundamentos).
O Prof.
Marcello Caetano, é da opinião
que o que constitui caso julgado é a decisão e não os motivos ou fundamentos
dela, contrariamente ao Prof. Vasco Pereira da Silva.
O Prof.
Marcello considera ainda que “o caso julgado material nasce de uma indagação de
carácter cognoscitivo, tendo por objecto determinar quais os interesses
juridicamente protegidos de entre os que estejam em litigio ou em duvida; ao
passo que o acto administrativo é um produto da acção, eminentemente volitiva,
desenvolvida em execução da lei no intuito de realizar o interesse publico”.
O caso julgado
detém como características essenciais, a imodificabilidade, a irrepetibilidade,
imunidade, superioridade, obrigatoriedade, executoriedade e invocabilidade, como ensina o Prof.
Freitas de Amaral.
Quanto à eficácia
do caso julgado, a doutrina portuguesa questiona se apenas existe eficácia
inter partes - subjectivo ou erga omnes - objectivo (atinge pessoas não
intervenientes no processo, que possam ser beneficiadas ou prejudicadas com a
decisão jurisdicional).
O Prof. Fezas Vital era da opinião que o
âmbito do caso julgado era erga omnes, pois a causa de pedir ou fundamento da
acção de impugnação é a anulação do acto administrativo ilegal, portanto, que
visa a defesa da legalidade objectiva, logo, para si, os efeitos de anulação é
absoluta, objectiva ou erga omnes, projectando-se na esfera jurídica de todas
as pessoas ou destinatários.
O Prof.
Marcello Caetano, considerava que se a anulação se fundasse na ilegalidade
objectiva então, e se se tratar de uma acto indivisível, a anulação fá-lo-ia
desaparecer totalmente da ordem Jurídica – eficácia erga omnes, ao contrário
dos actos divisíveis.
O Prof. Freitas
de Amaral entende que a decisão jurisdicional baseada em fundamentos objectivos
deve valer quer para as decisões de negação de provimento ao recurso quer para
as de concessão de provimento; tanto uma como outra terá eficácia erga omnes se
forem baseadas em fundamentos objectivos.
O Prof. Vasco
Pereira da Silva assume uma visão subjectiva do contencioso administrativo, que
terá como consequência natural, a eficácia subjectivista do caso julgado das
sentenças dos tribunais administrativos sobre a anulação de um acto
administrativo lesivo do direito ou interesse do particular legalmente
protegido.
O Prof. Vieira
de Andrade refere que as sentenças, em regra, produzem os seus efeitos apenas
entre partes, sendo normal que valha para os interessados, aqueles que
estiveram ou deveriam de ter estado em juízo. É considerada uma regra axiomática,
quando estejam em causa obrigações decorrentes da sentença, em face do
principio do contraditório e dos direitos fundamentais de audiência e de
defesa.
O CPTA de
facto, adopta uma posição subjectivista, isto é, a regra será a de eficácia
inter partes, mas com algumas excepções.
Actos
Plurais
Estes actos serviam para equilibrar o
prato da balança no que toca a questão da eficácia subjectiva de anulação de um
acto administrativo.
Segundo o Prof. Vasco Pereira da Silva,
os actos plurais são conjunto de actos, lógica e praticamente separáveis, com
uma pluralidade de destinatários, mas quem se encontram formalmente unificados.
Para os Prof. Diogo Freitas de Amaral e
Paulo Otero, os actos não deixam de ser divisíveis e individualizáveis em
termos autónomos pelo respectivo conteúdo.
Já o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa,
considera que os actos plurais são actos que produzem efeitos idênticos em relação
a uma pluralidade de pessoas, instrumentalmente unificados numa exteriorização única
por razões de economia e de eficiência procedimentais.
O Prof. Vasco Pereira da Silva afirma que
numa sentença de anulação resultante de um processo em que só participaram
algum ou alguns dos destinatários, o acto possa vir a ser anulado em relação àqueles
destinatários que participaram no processo, sem o ser relativamente aos demais,
assim como os Prof. Freitas e Paulo Otero.
Por fim, a Jurisprudência afirma que o
efeito erga omnes apenas opera quanto aos actos indivisíveis, não relativamente
àqueles que, por serem divisíveis e individuais e não terem sido objecto da
decisão anulatória, não estão a coberto do caso julgado.
Extensão
dos efeitos da sentença
O instituto da extensão dos efeitos da
sentença é uma das novidades de agilização processual que o CPTA de 2002 veio
introduzir no contencioso administrativo, previsto no art. 161º CPTA, acolhida
com satisfação pela doutrina e jurisprudência.
Teve como fonte de inspiração a Ley de la
Jurisdicción Contencioso-Administrativa Espanhola de 1998, de 13 de Júlio, no
seu art. 110º.
O CPTA permite a extensão dos efeitos da
sentença no domínio do funcionalismo publico e no âmbito de concursos e
conjecturas de massas (art. 161º nº2), todavia a extensão só pode ser pedida
relativamente aos efeitos de sentença que tenham anulado um acto administrativo
desfavorável, isto é, no domínio de acção administrativa especial, ou
reconhecido uma situação jurídica favorável, no domínio da acção administrativa
comum, nos termos do art. 37º nº2.
A extensão pode beneficiar dois tipos de
terceiros: aqueles que interpuseram um processo, isto e, os processos que ainda
se encontram pendentes e aqueles que nunca chegaram a fazer uso do meio
processual devido, neste último caso, existe uma intenção do legislador de
beneficiar os terceiros alheios ao processo, mas também de aliviar os tribunais
administrativos. E livrá-los de repetição do julgamento sobre a mesma matéria
ou litigio onde já foi demandada a mesma entidade administrativos.
Para a extensão é necessário que certos
requisitos cumulativos se encontrem previstos:
1)
que os
requerentes se encontrem na mesma situação jurídica das pessoas a que se
reportam essas sentenças a não ser que sejam contra-interessados (nº5);
2)
que não haja
sentença transitada em julgado relativamente aos mesmos requerentes
3)
que os caos
decididos sejam perfeitamente idênticos
4)
que, no mesmo
sentido, tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado, ou,
existindo situações de processos em massa, nesse sentido tenham sido decididos
em três casos os processos seleccionados segundo o disposto no art. 48º
O que dizer?
Como ensina o Prof. Vieira de Andrade, quanto aos
efeitos desfavoráveis da sentença anulatória, desde logo, quanto aos
prejudicados pela anulação do acto, tem de se concluir, em geral, que apenas se
produzem inter partes – embora se deva ter em conta que as partes não são
apenas o demandante e a entidade demandada, mas também os contra-interessados,
sendo o litisconsórcio necessário nos processos impugnatórios.
Quanto ao caso especial dos efeitos das sentenças nas
acções populares, importa referir que as sentenças, face à sua finalidade de
defesa de valores comunitários, deve ter eficácia geral, sem prejuízo do
chamado opting out (art. 19º LAP).
É de lamentar a duplicidade de órgãos a
que o particular tem de recorrer no primeiro momento para apresentar o pedido
de extensão dos efeitos da sentença que transitou em julgado.
É igualmente de lamentar os prazos
escolhidos para o preceito, pois, se atentarmos os números 3 e 4 do 161º, verificamos
que o pedido de extensão poderá levar entre um ano a um ano e meio para ser
decidido, algo que é de duvidosa aceitação, sem contar com a eventual
possibilidade de o recurso sobre o pedido de extensão vier a ser negado provimento.
Assim como a exigência de várias sentenças
proferidas, sem razão de ser, sendo de preferir a solução original, sendo como
tal, o art. 161º nº2 incongruente.
Bibliografia:
-
ASCENSAO, José
Oliveira de, Teoria Geral do Direito Civil, Vol.III, Titulo IV, Lisboa,
1991/1992
-
CAETANO,
Marcello, Manual de Direito Administrativo, Vol. II,
-
AMARAL, Freitas de, Direito
Administrativo, Vol.IV
-
ANDRADE, José Carlos
Vieira de Andrade, A justiça Administrativa, Lições, 2011 11º edição, Almedina
-
ALMEIDA, Mário Aroso
de, Manual de Processo Administrativo, 2010, Almedina
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