terça-feira, 22 de maio de 2012

Eficácia do caso julgado no contencioso administrativo


Efeitos da sentença e eficácia do caso julgado no Contencioso Administrativo

No âmbito do Direito Administrativo, existem vários tipos de sentenças, nomeadamente as sentenças simplesmente declarativas; as sentenças constitutivas – aquelas que produzem ou autorizam uma alteração na ordem jurídica existente, criando, modificando ou extinguindo uma relação ou situação jurídica, que para o Direito Administrativo, tem especial importância quando a sentença determina a invalidade retroactiva de actos de autoridade, concretos ou normativos que violam a lei ou um direito ou interesse legalmente previsto); as sentenças condenatórias – hipóteses de condenação que implica uma intimação de uma autoridade publica para a adopção dou abstenção de comportamentos e, sobretudo, a de poder haver a condenação à omissão ou à pratica de um acto administrativo devido; sentenças de provimento – que podem combinar diversos efeitos desde o condenatório, declarativo ou constitutivo, conforme a pretensão do autor e as circunstancias do caso, permitido pela cumulação de pedidos (art. 4º e 47º CPTA); sentenças de execução.
Logo, podemos concluir, que tal como no processo civil, a sentença é um título executivo que arroga o titular, o direito de a fazer executar por meios legais disponíveis, neste caso, recorrer aos tribunais administrativos para a executar, quer seja contra a AP (art. 153º nº3 CPTA), quer seja contra o particular (art. 157º nº2 CPTA).
As sentenças têm como características fundamentais, a sua obrigatoriedade e prevalência, nos termos do art. 158º CPTA.
A primeira, tendente à obrigatoriedade perante as entidades públicas e privadas e a segunda, mostra a prevalência sobre as de quaisquer autoridades administrativas, implicando a nulidade de qualquer acto administrativo que a desrespeite.
Relativamente, aos efeitos das sentenças administrativas, como o Prof. Oliveira Ascensão ensina, os mesmo são considerados os resultados da aplicação de uma lei ou a exteriorização da vontade através de um acto publico ou privado tutelada pela lei.
Os efeitos processuais da sentença administrativa, que se observam são: o caso julgado; extinção da relação jurídica processual ou da instancia; possibilidade de execução, se a sentença for condenatória e tiver transitado em julgado ou houver sido objecto de recurso com efeito meramente devolutivo; esgotamento do poder jurisdicional do juiz quanto à matéria decidida, no sentido em que o juiz não pode alterar nem o sentido da decisão, nem nenhum dos seus fundamentos, ficando vinculado à decisão proferida, entre outros.
Quanto ao caso julgado, importa, antes de mais, proceder à sua definição. A doutrina define o caso julgado sob duas formas: material ou formal. Quanto ao caso julgado material questiona-se qual o seu âmbito ( se inclui apenas a decisão, ou igualmente os fundamentos).
O Prof. Marcello Caetano, é da opinião que o que constitui caso julgado é a decisão e não os motivos ou fundamentos dela, contrariamente ao Prof. Vasco Pereira da Silva.
O Prof. Marcello considera ainda que “o caso julgado material nasce de uma indagação de carácter cognoscitivo, tendo por objecto determinar quais os interesses juridicamente protegidos de entre os que estejam em litigio ou em duvida; ao passo que o acto administrativo é um produto da acção, eminentemente volitiva, desenvolvida em execução da lei no intuito de realizar o interesse publico”.
O caso julgado detém como características essenciais, a imodificabilidade, a irrepetibilidade, imunidade, superioridade, obrigatoriedade, executoriedade e  invocabilidade, como ensina o Prof. Freitas de Amaral.

Quanto à eficácia do caso julgado, a doutrina portuguesa questiona se apenas existe eficácia inter partes - subjectivo ou erga omnes - objectivo (atinge pessoas não intervenientes no processo, que possam ser beneficiadas ou prejudicadas com a decisão jurisdicional).
 O Prof. Fezas Vital era da opinião que o âmbito do caso julgado era erga omnes, pois a causa de pedir ou fundamento da acção de impugnação é a anulação do acto administrativo ilegal, portanto, que visa a defesa da legalidade objectiva, logo, para si, os efeitos de anulação é absoluta, objectiva ou erga omnes, projectando-se na esfera jurídica de todas as pessoas ou destinatários.
O Prof. Marcello Caetano, considerava que se a anulação se fundasse na ilegalidade objectiva então, e se se tratar de uma acto indivisível, a anulação fá-lo-ia desaparecer totalmente da ordem Jurídica – eficácia erga omnes, ao contrário dos actos divisíveis.
O Prof. Freitas de Amaral entende que a decisão jurisdicional baseada em fundamentos objectivos deve valer quer para as decisões de negação de provimento ao recurso quer para as de concessão de provimento; tanto uma como outra terá eficácia erga omnes se forem baseadas em fundamentos objectivos.
O Prof. Vasco Pereira da Silva assume uma visão subjectiva do contencioso administrativo, que terá como consequência natural, a eficácia subjectivista do caso julgado das sentenças dos tribunais administrativos sobre a anulação de um acto administrativo lesivo do direito ou interesse do particular legalmente protegido.
O Prof. Vieira de Andrade refere que as sentenças, em regra, produzem os seus efeitos apenas entre partes, sendo normal que valha para os interessados, aqueles que estiveram ou deveriam de ter estado em juízo. É considerada uma regra axiomática, quando estejam em causa obrigações decorrentes da sentença, em face do principio do contraditório e dos direitos fundamentais de audiência e de defesa.
O CPTA de facto, adopta uma posição subjectivista, isto é, a regra será a de eficácia inter partes, mas com algumas excepções.

Actos Plurais

Estes actos serviam para equilibrar o prato da balança no que toca a questão da eficácia subjectiva de anulação de um acto administrativo.
Segundo o Prof. Vasco Pereira da Silva, os actos plurais são conjunto de actos, lógica e praticamente separáveis, com uma pluralidade de destinatários, mas quem se encontram formalmente unificados.
Para os Prof. Diogo Freitas de Amaral e Paulo Otero, os actos não deixam de ser divisíveis e individualizáveis em termos autónomos pelo respectivo conteúdo.
Já o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, considera que os actos plurais são actos que produzem efeitos idênticos em relação a uma pluralidade de pessoas, instrumentalmente unificados numa exteriorização única por razões de economia e de eficiência procedimentais.
O Prof. Vasco Pereira da Silva afirma que numa sentença de anulação resultante de um processo em que só participaram algum ou alguns dos destinatários, o acto possa vir a ser anulado em relação àqueles destinatários que participaram no processo, sem o ser relativamente aos demais, assim como os Prof. Freitas e Paulo Otero.
Por fim, a Jurisprudência afirma que o efeito erga omnes apenas opera quanto aos actos indivisíveis, não relativamente àqueles que, por serem divisíveis e individuais e não terem sido objecto da decisão anulatória, não estão a coberto do caso julgado.

Extensão dos efeitos da sentença

O instituto da extensão dos efeitos da sentença é uma das novidades de agilização processual que o CPTA de 2002 veio introduzir no contencioso administrativo, previsto no art. 161º CPTA, acolhida com satisfação pela doutrina e jurisprudência.
Teve como fonte de inspiração a Ley de la Jurisdicción Contencioso-Administrativa Espanhola de 1998, de 13 de Júlio, no seu art. 110º.
O CPTA permite a extensão dos efeitos da sentença no domínio do funcionalismo publico e no âmbito de concursos e conjecturas de massas (art. 161º nº2), todavia a extensão só pode ser pedida relativamente aos efeitos de sentença que tenham anulado um acto administrativo desfavorável, isto é, no domínio de acção administrativa especial, ou reconhecido uma situação jurídica favorável, no domínio da acção administrativa comum, nos termos do art. 37º nº2.

A extensão pode beneficiar dois tipos de terceiros: aqueles que interpuseram um processo, isto e, os processos que ainda se encontram pendentes e aqueles que nunca chegaram a fazer uso do meio processual devido, neste último caso, existe uma intenção do legislador de beneficiar os terceiros alheios ao processo, mas também de aliviar os tribunais administrativos. E livrá-los de repetição do julgamento sobre a mesma matéria ou litigio onde já foi demandada a mesma entidade administrativos.

Para a extensão é necessário que certos requisitos cumulativos se encontrem previstos:  
1)    que os requerentes se encontrem na mesma situação jurídica das pessoas a que se reportam essas sentenças a não ser que sejam contra-interessados (nº5);
2)    que não haja sentença transitada em julgado relativamente aos mesmos requerentes
3)    que os caos decididos sejam perfeitamente idênticos
4)    que, no mesmo sentido, tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado, ou, existindo situações de processos em massa, nesse sentido tenham sido decididos em três casos os processos seleccionados segundo o disposto no art. 48º
O que dizer?

Como ensina o Prof. Vieira de Andrade, quanto aos efeitos desfavoráveis da sentença anulatória, desde logo, quanto aos prejudicados pela anulação do acto, tem de se concluir, em geral, que apenas se produzem inter partes – embora se deva ter em conta que as partes não são apenas o demandante e a entidade demandada, mas também os contra-interessados, sendo o litisconsórcio necessário nos processos impugnatórios.

Quanto ao caso especial dos efeitos das sentenças nas acções populares, importa referir que as sentenças, face à sua finalidade de defesa de valores comunitários, deve ter eficácia geral, sem prejuízo do chamado opting out (art. 19º LAP).

É de lamentar a duplicidade de órgãos a que o particular tem de recorrer no primeiro momento para apresentar o pedido de extensão dos efeitos da sentença que transitou em julgado.
É igualmente de lamentar os prazos escolhidos para o preceito, pois, se atentarmos os números 3 e 4 do 161º, verificamos que o pedido de extensão poderá levar entre um ano a um ano e meio para ser decidido, algo que é de duvidosa aceitação, sem contar com a eventual possibilidade de o recurso sobre o pedido de extensão vier a ser negado provimento.
Assim como a exigência de várias sentenças proferidas, sem razão de ser, sendo de preferir a solução original, sendo como tal, o art. 161º nº2 incongruente.










Bibliografia:

-       ASCENSAO, José Oliveira de, Teoria Geral do Direito Civil, Vol.III, Titulo IV, Lisboa, 1991/1992
-       CAETANO, Marcello, Manual de Direito Administrativo, Vol. II,
-        AMARAL, Freitas de, Direito Administrativo, Vol.IV
-       ANDRADE, José Carlos Vieira de Andrade, A justiça Administrativa, Lições, 2011 11º edição, Almedina
-       ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, 2010, Almedina


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