quarta-feira, 23 de maio de 2012

Declaração da ilegalidade por omissão de normas regulamentares




Em primeiro lugar cumpre dar a conhecer o dispositivo que se nos apresenta. Estamos perante um mecanismo, introduzido após a reforma do Contencioso Administrativo, destinado a reagir contra omissões ilegais de emissão de regulamentos por parte da administração, isto é, situações em que estando a administração vinculada por lei a emitir um regulamento e não o faça, nas palavras de Mário Aroso de Almeida, quando estejam em causa ‘’ normas administrativas cuja adopção seja necessária para dar exequibilidade a actos legislativos carentes de regulamentação”.

Muito defendida anteriormente por João Caupers e Paulo Otero, o primeiro dos autores invocando a violação de um dever jurídico de regulamentar, sendo necessário um meio para reagir contra esta violação, sugeria a possibilidade de as partes designadas, no art.º 9º do CPTA obterem uma condenação judicial, uma sentença, neste caso, reconhecendo essa omissão e exigindo um prazo para a mesma ser suprida. Já Paulo Otero, tem por fundamentos, na defesa deste mecanismo como uma solução à inercia dos tribunais administrativos quanto ao poder regulamentar, a analogia á fiscalização da constitucionalidade por omissão, mecanismo previsto no art.º 283º da Constituição da República Portuguesa, em que o Tribunal Constitucional dá conhecimento dessa mesma inconstitucionalidade (por falta de lei que concretize uma norma constitucional) ao órgão competente. No caso da ilegalidade por omissão da emissão do acto regulamentar, o tribunal administrativo daria conhecimento da ilegalidade, ao órgão competente para a prática do acto regulamentar.

Com a reforma do Contencioso Administrativo, nasce assim o art.º 77º do CPTA e com ele a possibilidade de, em acção administrativa especial, (aplicando-se esta acção aos processos com o objecto descrito do art.º 46º, nº1 do CPTA, constituindo os seus principais pedidos, os enumerados no nº 2 do artigo citado) se suscitar um pedido de apreciação de situações de ilegalidade por omissão de normas regulamentares devidas, quer esse dever de regulamentar (omitido) resulte, de forma directa, da referência expressa de uma concreta lei, quer decorra, de forma indirecta, de uma remissão implícita para o poder regulamentar em virtude da incompletude ou da inexequibilidade do acto legislativo em questão. Quer se trate de regulamentos executivos, quer de regulamentos autónomos ou independentes (contanto que a sua emissão corresponda ao cumprimento de um dever legal), ambos se destinam a «dar exequibilidade a actos legislativos carentes de regulamentação» (77º nº1 C.P.T.A).
José Vieira de Andrade tal como Vasco Pereira da silva vêm dizer que este dispositivo deve abranger outros casos em que há uma vinculação da administração á emissão de regulamentos, como por exemplo, nos casos como sejam os casos da omissão de elaboração de planos urbanísticos ou de ordenamento do território, sendo este dever imposto por princípios jurídicos em determinadas situações concretas ou quer resulte de uma auto-vinculação administrativa.

Quanto a natureza das pronuncias judiciais que podem ser emitidas por aplicação deste mecanismo, defendem Mário Aroso de Almeida, tal como Vasco Pereira da Silva, que estas, são declarativas de tipo impositivo, sendo que, estarão mais próximas das pronuncias de condenação, do que das de simples apreciação ou declaração. Também José Vieira de Andrade considera esta pronúncia como tendo natureza próxima da condenatória, dado que o estabelecimento de um prazo (art. 77º nº 2 CPTA) para que a administração se pronuncie, não se enquadra numa recomendação ou comunicação. Em suma não há um mero poder do juiz declarar a omissão à Administração, nem há, numa linha mais forte, o poder de condenar a Administração à emissão do regulamento devido. Há, sim, o poder de declarar a omissão associando-lhe um prazo para a sua sanação.

Apesar da concordância quanto a natureza desta pronúncia, os efeitos que dai decorrem são divergentes nas ópticas dos autores supracitados. Para Vasco Pereira da Silva e Mário Aroso de Almeida o tribunal pode aplicar uma sanção pecuniária compulsória, logo no processo declarativo, ao abrigo do art.º 3º, nº 2 do CPTA, tal como a utilização dos mecanismos do processo executivo, já que a inobservância do prazo, consubstancia um acto de desobediência em relação a sentença, isto é, nos termos do art.º 164º, nº 4 alínea d), 168º e 169º do CPTA, o beneficiário ficará habilitado a desencadear a fixação de um prazo limite, com imposição de uma sanção pecuniária compulsória. Já José Vieira de Andrade não acompanha a posição dos autores acima citados, quanto as consequências que podem advir da pronuncia da administração quanto a omissão de normas regulamentares, quando haja vinculação da administração.



Bibliografia:

Silva, Vasco Pereira de. O Contencioso Administrativo no divã da Psicanálise. Almedina, 2009.
Andrade, José Vieira de. A Justiça Administrativa (Lições). Almedina, 2009.
Almeida, Mário Aroso de. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos.

Carina Piedade, nº 17209.

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