Após a revisão constitucional de
1997, o legislador administrativo viu-se obrigado em matéria de direitos,
liberdades e garantias, a adoptar, em conformidade com a Lei Fundamental, um
novo meio processual, com vista a consagrar o princípio da tutela jurisdicional
efectiva preceituado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa
(CRP), nascendo, o processo urgente de intimação para protecção de direitos,
liberdades e garantias do artigo 109º do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos (CPTA).
O artigo 109º CPTA, constitui um processo urgente principal em matéria de protecção de direitos, liberdades e garantias.
O artigo 109º CPTA, constitui um processo urgente principal em matéria de protecção de direitos, liberdades e garantias.
A grande diferença entre
processos urgentes, nos quais se destaca a intimação para protecção de
direitos, liberdades e garantias, e processos cautelares prende-se com o facto
de os primeiros não estarem interligados com o processo principal.
Os processos urgentes principais,
são processos autónomos, caracterizados por uma tramitação acelerada ou
simplificada, considerando que estão em jogo questões cuja resolução à partida
deve ocorrer num “tempo curto” não compatível com o tempo considerado normal
para a generalidade dos processos.
Estes processos, ao contrário dos
cautelares, decidem definitivamente o mérito da causa ou seja, desembocam em
decisões judiciais definitivas quanto ao seu mérito, dada obviamente a
celeridade com que no caso, se impõe alcançar a justa composição de todos os
interesses envolvidos.
Por sua vez, a tutela cautelar, é
caracterizada pela sua instrumentalidade (e provisoriedade) face ao processo
principal, pretendendo-se que através de medidas conservatórias ou
antecipatórias, seja provisoriamente regulada a situação em termos de se poder
assegurar a utilidade da sentença.
O decretamento provisório vem
previsto no artigo 131.º do CPTA e é utilizado quando se esteja perante
situações em que a urgência é tal que se permite que uma providência cautelar
seja decretada logo após se ter apresentado o pedido relativo à adopção da
providência. O n.º 1 refere o caso em que a referida providência se destine a
proteger direitos, liberdades e garantias.
A questão que cabe analisar,
prende-se com o facto de saber quando é que se pode recorrer ao decretamento
provisório da providência e quando se deve adoptar a via do processo urgente,
nomeadamente a intimação para direitos, liberdades e garantias.
A opção está estreitamente ligada
com a própria configuração entre um procedimento cautelar e um processo
urgente.
Em comum, têm o facto de, para o
seu decretamento é necessário que estejamos perante uma situação de “grande
urgência”. Com isto quer salientar-se que não podem estar em causa situações a
que se possa dar resposta através do processo comum, sob pena de privar os
particulares de uma tutela jurisdicional verdadeiramente efectiva – neste caso
um direito, liberdade e garantia não poder ser mais acautelado por não se ter
actuado atempadamente.
Tem, pois, que estar em causa uma
necessidade “especial” e prioritária na resolução do litígio.
Mas estes dois meios têm
diferenças, por um lado o artigo 109º do CPTA permite uma decisão de mérito,
enquanto o 131º, possibilita, tão só, uma decisão provisória para protecção do
direito até ao julgamento da causa em sede de processo principal.
Se a questão de mérito não se
compaginar com uma demora deve optar -se pela intimação para protecção de direitos,
liberdades e garantias, nos termos dos artigos 109.º ss. Apesar de esta não ser
a via comum de defesa dos direitos, liberdades e garantias, pois essa é a do
processo comum, e apesar de ainda se ter de passar pelo crivo de não ser
aplicável uma providência cautelar, a intimação constitui um meio que permite
obter, rapidamente, uma decisão de fundo sobre uma situação em que estão em
causa direitos de particular importância para o ordenamento jurídico português.
Ao requerente da intimação caberá
alegar e provar (ainda que de forma sumária) que só a procedência do pedido de
intimação lhe proporcionará a plenitude do exercício do seu direito,
demonstrando assim a indispensabilidade da intimação, face ao caso concreto.
A ideia de Subsidiariedade entre
o artigo 109º e o 131º tem sido retirada, desde logo, da remissão que o artigo
109º nº1 faz para o 131º CPTA.
Havendo, mesmo, Doutrina que
denomina esta situação de “dupla subsidiariedade”. Considerando que, o
requisito de impossibilidade de decretamento da providência e a insuficiência
da providência por não conferir uma decisão definitiva consubstanciam o primeiro
patamar. O segundo prende-se com o facto de só se recorrer à intimação se não
se puder lançar mão de qualquer outro meio que permita tutelar adequadamente o
direito em apreço.
Não obstante a lei parecer clara
no tocante à subsidiariedade, há doutrina que questiona se do espírito da lei
não se retira, antes, uma verdadeira alternatividade entre ambas as acções
processuais.
Ainda que a providência cautelar
do 131º surja como o meio de defesa preferencial, a verdade é que, será sempre
necessário analisar o caso concreto e perceber o que se pretende com a acção
colocada, pois muitas vezes a providência cautelar poderá ser utilizada num
sentido e com um objectivo díspar da sua própria natureza, sendo instaurada
como forma de obtenção de uma decisão definitiva, que uma vez proferida, fará
com que não exista qualquer interesse no seguimento de um processo de
reconhecimento de direitos principal.
Lançar mão desta subsidiariedade
do 109º do CPTA para fazer da providência cautelar uma forma de obtenção de uma
decisão de mérito, em detrimento do processo urgente, seria confundir os papéis
que cada uma das acções possui no contencioso administrativo, desvirtuando o
que o legislador pretendera ao criar este elo de ligação entre ambas as tutelas
jurisdicionais de direitos, liberdades e garantias de forma célere.
Assim, sempre que esteja em causa urgência na decisão, mas a decisão pretendida
seja uma decisão de mérito, uma decisão que, uma vez proferida, não confira
qualquer interesse no prosseguimento de uma outra acção dita principal, não
poderá ser nunca, a providência cautelar o meio de agir, não se podendo nunca
equacionar como legítimo o recurso à última parte do nº1 do artigo 109º do CPTA
de modo a afastar a acção urgente de intimação para protecção de direito, liberdades
e garantias.
O processo urgente do 109º do
CPTA funcionará, segundo o exposto, em alternatividade, mais do que
subsidiariedade pura com o artigo 131º do CPTA ou, até mesmo, com qualquer
providência cautelar específica destinada a tutela de direitos, liberdades e
garantias, pois será possível ser o processo urgente, à luz do caso concreto, o
único meio processual utilizável e admissível à satisfação da pretensão do
requerente. A urgência do 109º andará lado a lado com a provisoriedade do 131º
do CPTA, não se encontrando forçosamente na retaguarda desta última.
Entende Paulo Pereira Gouveia,
que o CPTA e a CRP impõem que o juiz faça a convolação oficiosa do processo
principal urgente regulado no 109º em pedido de decretamento provisório de
providência cautelar, quando o juiz considerar que não se impõe a tutela de
fundo. Mas, continua o autor, se não se verificarem os pressupostos requeridos
no artigo 131º nº1 do CPTA, o juiz pode convolar o pedido formulado ao abrigo
do artigo 109º num pedido de providência cautelar.
Bibliografia:
Almeida, Mário
Aroso de, Manual de Processo Administrativo, Coimbra, Almedina, 2010;
Andrade, José Vieira de, A Justiça Administrativa – Lições,
Coimbra, Almedina, 2009;
Cadernos Justiça Administrativa, nº55, Coimbra, reimpressão
2006;
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