Em
primeiro lugar cumpre dar a conhecer o dispositivo que se nos apresenta.
Estamos perante um mecanismo, introduzido após a reforma do Contencioso
Administrativo, destinado a reagir contra omissões ilegais de emissão de
regulamentos por parte da administração, isto é, situações em que estando a
administração vinculada por lei a emitir um regulamento e não o faça, nas
palavras de Mário Aroso de Almeida, quando estejam em causa ‘’ normas
administrativas cuja adopção seja necessária para dar exequibilidade a actos
legislativos carentes de regulamentação”.
Muito
defendida anteriormente por João Caupers e Paulo Otero, o primeiro dos autores
invocando a violação de um dever jurídico de regulamentar, sendo necessário um
meio para reagir contra esta violação, sugeria a possibilidade de as partes designadas, no
art.º 9º do CPTA obterem uma condenação judicial, uma sentença, neste caso, reconhecendo
essa omissão e exigindo um prazo para a mesma ser suprida. Já Paulo Otero, tem por
fundamentos, na defesa deste mecanismo como uma solução à inercia dos tribunais
administrativos quanto ao poder regulamentar, a analogia á fiscalização da
constitucionalidade por omissão, mecanismo previsto no art.º 283º da
Constituição da República Portuguesa, em que o Tribunal Constitucional dá
conhecimento dessa mesma inconstitucionalidade (por falta de lei que concretize
uma norma constitucional) ao órgão competente. No caso da ilegalidade por omissão
da emissão do acto regulamentar, o tribunal administrativo daria conhecimento
da ilegalidade, ao órgão competente para a prática do acto regulamentar.
Com
a reforma do Contencioso Administrativo, nasce assim o art.º 77º do CPTA e com
ele a possibilidade de, em acção administrativa especial, (aplicando-se esta
acção aos processos com o objecto descrito do art.º 46º, nº1 do CPTA, constituindo os
seus principais pedidos, os enumerados no nº 2 do artigo citado) se suscitar um
pedido de apreciação de situações de ilegalidade por omissão de normas
regulamentares devidas, quer esse dever de regulamentar (omitido) resulte, de
forma directa, da referência expressa de uma concreta lei, quer decorra, de
forma indirecta, de uma remissão implícita para o poder regulamentar em virtude
da incompletude ou da inexequibilidade do acto legislativo em questão. Quer se trate de regulamentos executivos, quer de regulamentos autónomos ou
independentes (contanto que a sua emissão corresponda ao cumprimento de um
dever legal), ambos se destinam a «dar exequibilidade a actos legislativos
carentes de regulamentação» (77º nº1 C.P.T.A).
José
Vieira de Andrade tal como Vasco Pereira da silva vêm dizer que este dispositivo
deve abranger outros casos em que há uma vinculação da administração á emissão
de regulamentos, como por exemplo, nos casos como sejam os casos da omissão de
elaboração de planos urbanísticos ou de ordenamento do território, sendo este
dever imposto por princípios jurídicos em determinadas situações concretas ou
quer resulte de uma auto-vinculação administrativa.
Quanto
a natureza das pronuncias judiciais que podem ser emitidas por aplicação deste
mecanismo, defendem Mário Aroso de Almeida, tal como Vasco Pereira da Silva,
que estas, são declarativas de tipo impositivo, sendo que, estarão mais próximas
das pronuncias de condenação, do que das de simples apreciação ou declaração.
Também José Vieira de Andrade considera esta pronúncia como tendo natureza próxima da condenatória,
dado que o estabelecimento de um prazo (art. 77º nº 2 CPTA) para que a
administração se pronuncie, não se enquadra numa recomendação ou comunicação. Em
suma não há um mero poder do juiz declarar a omissão à Administração, nem há,
numa linha mais forte, o poder de condenar a Administração à emissão do
regulamento devido. Há, sim, o poder de declarar a omissão associando-lhe um
prazo para a sua sanação.
Apesar
da concordância quanto a natureza desta pronúncia, os efeitos que dai decorrem
são divergentes nas ópticas dos autores supracitados. Para Vasco Pereira da
Silva e Mário Aroso de Almeida o tribunal pode aplicar uma sanção pecuniária
compulsória, logo no processo declarativo, ao abrigo do art.º 3º, nº 2 do CPTA, tal como a utilização dos
mecanismos do processo executivo, já que a inobservância do prazo, consubstancia
um acto de desobediência em relação a sentença, isto é, nos termos do art.º
164º, nº 4 alínea d), 168º e 169º do CPTA, o beneficiário ficará habilitado a
desencadear a fixação de um prazo limite, com imposição de uma sanção pecuniária
compulsória. Já José Vieira de Andrade não acompanha a posição dos autores acima citados, quanto as consequências que podem advir da pronuncia da administração quanto a omissão de normas regulamentares, quando haja vinculação da administração.
Bibliografia:
Silva, Vasco Pereira de. O Contencioso Administrativo no divã da
Psicanálise. Almedina, 2009.
Andrade, José Vieira de. A Justiça Administrativa (Lições).
Almedina, 2009.
Almeida, Mário Aroso de. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos.
Carina Piedade, nº 17209.
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