Até à aprovação do CPTA, a figura das sentenças
substitutivas de actos administrativos
não conheceu, no Direito Português, consagração em sede de regime geral. No entanto, podiam ser encontrados alguns
exemplos de substituição jurisdicional da prática de condutas administrativas
unilaterais, a partir de legislação especial. Era o caso do art. 112º, nº 9 e
10 do DL 555/99, que na sua redacção originária, dizia que, intimada a
Administração para a emissão de uma licença, sem que o tivesse feito no prazo
fixado na intimação, o particular poderia dirigir-se à Câmara e requerer a
emissão do consequente alvará, valendo a sentença como a sentença ilegalmente
omitida. Também se geravam entendimentos doutrinários que defendiam a emissão
de sentenças substitutivas de actos administrativos, na acção para
reconhecimento de direitos e interesses legalmente protegidos, como o já revogado
art. 69º da LPTA, e as medidas provisórias previstas no art. 5º do DL 134/98,
de 15 de Maio, que aprovou o regime jurídico do recurso contencioso dos actos
administrativos relativo à formação dos contratos de empreitada de obras
públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens.
De acordo com o art. 3º, nº1, do CPTA, no respeito pelo
princípio da separação e interdependência dos poderes, os Tribunais Administrativos
julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que
a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação.
As sentenças substitutivas de actos administrativos
consistem num fenómeno em que os Tribunais Administrativos, mediante uma
permissão normativa conferida pelo ordenamento jurídico, praticam actos em
matérias sobre as quais a competência primária ou normal pertence aos órgãos da
Administração, podendo o acto resultante da substituição conter o suprimento da
omissão da prática de um acto administrativo ou a sua revogação, desde que
acompanhada da introdução de uma nova disciplina para a situação juridica
regulada pelo acto revogado.
Podemos descrever três elementos essenciais quanto a este
fenómeno substitutivo:
Um elemento estrutural, que se traduz numa sub-rogação do
órgâo jurisdicional a um órgão administrativo, em que o primiro se substitui ao
segundo. A iniciativa da substituição nunca pertence, nos termos do CPTA, ao
órgão jurisdicional emitente da própria sentença substitutiva, uma vez que tem
de ser solicitado pelos interessados ou participantes na situação jurídica que
o juíz é chamado a definir;
Um elemento funcional, na medida em que a substituição
possibilita ao órgão substituto praticar actos sobre matérias cuja competência
primária ou normal pertence ao órgão substituído;
Um elemento legitimador, porque a substituição tem sempre
subjacente uma permissão conferida pela ordem jurídica conferida ao órgão
substituto.
Quanto a estes dois últimos elementos, no quadro da
separação de poderes,a substituição por um Tribunal deve ocorrer nos estritos
limites da matéria inerente à compreensão da função jurisdicional, ou seja, da
tutela de direitos e interesses legítimos, da resolução dos conflitos de
interesses públicos e privados e da repressão das violações da legitimidade
democrática. Isto significa que os Tribunais Administrativos não podem invadir
o domínio material próprio da função administrativa, identificável por apelo à
alínea g) do art. 199º da Constituição, tanto com a “promoção do
desenvolvimento económico e social” como com a “satisfação das necessidades
colectivas”, e enquadrado por um principio de auto tutela administrativa, que
tem previsão constitucional no art. 268º, nº4.
Por outro lado, com a revogação resultante da substituição
jurisdicional apenas se pode visar a reintegração da ordem jurídica violada,
mediante a supressão da infracção cometida com a prática de um acto ilegal,
pois só assim se conservará nos limites ou da tutela dos direitos de
particulares, se ela integrar o bloco de legalidade da conduta a revogar, ou da
repressão da violação da legalidade democrática, ou ainda da resolução de um
conflito de interesses a que se possa pôr termo por apelo ao Direito como
critério e fundamento únicos, preenchendo, quanto a este aspecto o figurino da
anulação de actos administrativos.
Podemos distinguir os
casos em que a norma jurídica habilita literalmente o juíz a substituir-se à
Administração na prática de actos administrativos, e os casos em que essa
substituição é implícita.
Quanto ao primeiro, podemos invocar o art. 3º, nº3, nos
termos do qual, “os Tribunais Administrativos asseguram ainda a execução das
suas sentenças (...), seja através da emissão de sentença que produza os
efeitos do acto administrativo devido, (...), o art. 157º, nº4, segundo o qual,
“sem prejuízo do disposto em lei especial(...), aplicável para obter a emissão
de sentença que produza os efeitos de alvará ilegalmente recusado ou omitido”,o
art. 164º, nº 4, alínea c), que refere que, “ Na petição, o exequente deve
especificar os actos e operações em que entende que a execução deve deve
consistir, podendo requerer, para além da indemnização moratória a que tenha
direito,estando em causa a prática de acto administrativo legalmente devido de
conteúdo vinculado, a emissão pelo próprio Tribunal de sentença que produza os
efeitos de acto ilegalmente omitido”, o nº 6 do art. 167º, que nos diz que, “
Estando em causa a prática de acto administrativo legalmente devido de conteúdo
vinculado, o próprio tribunal emite sentença que produza os efeitos do acto
ilegalmente omitido, e finalmente, o art.179º, nº5, que refere que, " quando, estando em causa a prática de um acto administrativo legalmente devido de conteúdo vinculado, (...) pode interessado requerer ao tribunal a emissão de sentença que produza os efeitos do acto ilegalmente omitido". Fora do domínio da execução de sentenças, o CPTA apenas
num caso prevê a figura da substituição judicial do acto administrativo.
Trata-se do art. 109º, nº3, quando o interessado pretenda a emissão de um acto
administrativo estritamente vinculado, no processo de Intimação para protecção de
direitos, liberdades e garantias.
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