domingo, 20 de maio de 2012

As sentenças substitutivas de acto administrativo- Introdução


Até à aprovação do CPTA, a figura das sentenças substitutivas  de actos administrativos não conheceu, no Direito Português, consagração em sede de regime geral.  No entanto, podiam ser encontrados alguns exemplos de substituição jurisdicional da prática de condutas administrativas unilaterais, a partir de legislação especial. Era o caso do art. 112º, nº 9 e 10 do DL 555/99, que na sua redacção originária, dizia que, intimada a Administração para a emissão de uma licença, sem que o tivesse feito no prazo fixado na intimação, o particular poderia dirigir-se à Câmara e requerer a emissão do consequente alvará, valendo a sentença como a sentença ilegalmente omitida. Também se geravam entendimentos doutrinários que defendiam a emissão de sentenças substitutivas de actos administrativos, na acção para reconhecimento de direitos e interesses legalmente protegidos, como o já revogado art. 69º da LPTA, e as medidas provisórias previstas no art. 5º do DL 134/98, de 15 de Maio, que aprovou o regime jurídico do recurso contencioso dos actos administrativos relativo à formação dos contratos de empreitada de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens.
De acordo com o art. 3º, nº1, do CPTA, no respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, os Tribunais Administrativos julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação.
As sentenças substitutivas de actos administrativos consistem num fenómeno em que os Tribunais Administrativos, mediante uma permissão normativa conferida pelo ordenamento jurídico, praticam actos em matérias sobre as quais a competência primária ou normal pertence aos órgãos da Administração, podendo o acto resultante da substituição conter o suprimento da omissão da prática de um acto administrativo ou a sua revogação, desde que acompanhada da introdução de uma nova disciplina para a situação juridica regulada pelo acto revogado.
Podemos descrever três elementos essenciais quanto a este fenómeno substitutivo:
Um elemento estrutural, que se traduz numa sub-rogação do órgâo jurisdicional a um órgão administrativo, em que o primiro se substitui ao segundo. A iniciativa da substituição nunca pertence, nos termos do CPTA, ao órgão jurisdicional emitente da própria sentença substitutiva, uma vez que tem de ser solicitado pelos interessados ou participantes na situação jurídica que o juíz é chamado a definir;
Um elemento funcional, na medida em que a substituição possibilita ao órgão substituto praticar actos sobre matérias cuja competência primária ou normal pertence ao órgão substituído;
Um elemento legitimador, porque a substituição tem sempre subjacente uma permissão conferida pela ordem jurídica conferida ao órgão substituto.
Quanto a estes dois últimos elementos, no quadro da separação de poderes,a substituição por um Tribunal deve ocorrer nos estritos limites da matéria inerente à compreensão da função jurisdicional, ou seja, da tutela de direitos e interesses legítimos, da resolução dos conflitos de interesses públicos e privados e da repressão das violações da legitimidade democrática. Isto significa que os Tribunais Administrativos não podem invadir o domínio material próprio da função administrativa, identificável por apelo à alínea g) do art. 199º da Constituição, tanto com a “promoção do desenvolvimento económico e social” como com a “satisfação das necessidades colectivas”, e enquadrado por um principio de auto tutela administrativa, que tem previsão constitucional no art. 268º, nº4.
Por outro lado, com a revogação resultante da substituição jurisdicional apenas se pode visar a reintegração da ordem jurídica violada, mediante a supressão da infracção cometida com a prática de um acto ilegal, pois só assim se conservará nos limites ou da tutela dos direitos de particulares, se ela integrar o bloco de legalidade da conduta a revogar, ou da repressão da violação da legalidade democrática, ou ainda da resolução de um conflito de interesses a que se possa pôr termo por apelo ao Direito como critério e fundamento únicos, preenchendo, quanto a este aspecto o figurino da anulação de actos administrativos.
 Podemos distinguir os casos em que a norma jurídica habilita literalmente o juíz a substituir-se à Administração na prática de actos administrativos, e os casos em que essa substituição é implícita.
Quanto ao primeiro, podemos invocar o art. 3º, nº3, nos termos do qual, “os Tribunais Administrativos asseguram ainda a execução das suas sentenças (...), seja através da emissão de sentença que produza os efeitos do acto administrativo devido, (...), o art. 157º, nº4, segundo o qual, “sem prejuízo do disposto em lei especial(...), aplicável para obter a emissão de sentença que produza os efeitos de alvará ilegalmente recusado ou omitido”,o art. 164º, nº 4, alínea c), que refere que, “ Na petição, o exequente deve especificar os actos e operações em que entende que a execução deve deve consistir, podendo requerer, para além da indemnização moratória a que tenha direito,estando em causa a prática de acto administrativo legalmente devido de conteúdo vinculado, a emissão pelo próprio Tribunal de sentença que produza os efeitos de acto ilegalmente omitido”, o nº 6 do art. 167º, que nos diz que, “ Estando em causa a prática de acto administrativo legalmente devido de conteúdo vinculado, o próprio tribunal emite sentença que produza os efeitos do acto ilegalmente omitido, e finalmente, o art.179º, nº5, que refere que, " quando, estando em causa a prática de um acto administrativo legalmente devido de conteúdo vinculado, (...) pode  interessado requerer ao tribunal a emissão de sentença que produza os efeitos do acto ilegalmente omitido".  Fora do domínio da execução de sentenças, o CPTA apenas num caso prevê a figura da substituição judicial do acto administrativo. Trata-se do art. 109º, nº3, quando o interessado pretenda a emissão de um acto administrativo estritamente vinculado, no processo de Intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.


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