Nem sempre os processos
cautelares tiveram a mesma eficácia e a mesma amplitude. Esta matéria parecia
aos olhos dos mais eruditos completamente embrulhada e confundida com outros
meios processuais acessórios. Tomando as palavras de Vieira de Andrade[1], esta
era uma situação algo catastrófica. Os processos Cautelares estavam reduzidos à
suspensão da eficácia do acto tal como, expresso anteriormente[2], o
contencioso se reduzia ao recurso contencioso de anulação.
Referir, apenas, que a CRP desde
a revisão de 1997, passou a referir expressamente a protecção cautelar adequada
como uma dimensão do princípio da tutela jurisdicional efectiva[3].
O CPTA estabelece o regime
aplicável aos processos cautelares nos artigos 112.º a 134.º.
Como resulta do artigo 112.º, n.º
1 do diploma legal supra mencionado, o processo cautelar dirige-se à obtenção
de providências adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir num
processo declarativo. Desde logo, podemos perceber que a estes processos falta
a característica da autonomia uma vez que eles funcionam, apenas, ou como
incidentes do processo declarativo ou como preliminares deste.
Podemos encontrar espelhados,
quer na doutrina quer no próprio regime três traços caracterizadores:
A instrumentalidade[4] [5]que,
desde logo, decorre do que acima ficou dito quanto à falta de autonomia, ou
seja, o processo cautelar depende da causa (uma causa principal) que tem por
objecto a decisão sobre o mérito[6] – artigo
113.º CPTA; Mas o mesmo pode ser corroborado quando verificamos que só tem
legitimidade para intentar uma acção cautelar quem a tiver para intentar a
acção principal – artigo 112.º, n.º1; quando esta acção é usada como
“preliminar” da acção principal, a última tem de ser instaurada no prazo de
três meses sob pena de a primeira caducar – artigo 123.º, n.º 2; ou a mesma
sanção com caducidade se, as acções principais estiverem paradas durante mais
de três meses por negligência do interessado – artigo 123.º, n.º 1; essa
instrumentalidade demonstra-se, ainda, no despacho liminar que rejeitará o
requerimento se este não conter todos os elementos essenciais, se for manifesta
a ilegitimidade da entidade requerida ou a ilegalidade da pretensão formulada.
A provisoriedade resulta, em
primeiro lugar, do facto de uma providência cautelar só poder determinar
efeitos a título provisório, funciona como uma antecipação da decisão final
apenas a título provisório pela dependência a que está sujeita face à acção
principal. Isto porque o tribunal tem sempre a possibilidade de revogar,
alterar ou substituir, na pendência do processo principal, a sua decisão de
adoptar ou recusar a adopção de providências cautelares se tiver ocorrido uma
alteração relevante das circunstâncias inicialmente existentes – artigo 124.º,
n.º 1. A aparência de um bom direito constitui um dos critérios a considerar
para a concessão ou recusa das providências cautelares – artigo 120.º, n.º 1.
Quando o periculum in mora possa comprometer o efeito útil do processo
principal e só possa ser evitado através da antecipação de um efeito, que só
pode ser determinado pela sentença a proferir no processo principal, estaremos
no âmbito da tutela final urgente e não no âmbito das providências cautelares[7];
E, por último, a sumariedade[8] que consiste
em que o tribunal proceda a meras apreciações perfunctórias, baseadas num juízo
sumário sobre os factos a apreciar, evitando antecipar juízos definitivos, que,
em princípio, só devem ter lugar no processo principal[9].
O artigo 112.º, n.º2 permite que
as providências cautelares a adoptar possam ser providências típicas que se
encontram especificadas no CPC[10].
Apresenta, ainda, um elenco exemplificativo de outras providências tipicamente
administrativas que podem ser adoptadas, como a suspensão da eficácia de actos
administrativos[11] ou
normas regulamentares[12], a
atribuição provisória da disponibilidade de um bem, a autorização provisória ao
interessado para iniciar ou prosseguir uma actividade ou adoptar uma conduta e
a regulação provisória de uma situação jurídica, nomeadamente, através da
imposição do dever do pagamento de quantias ou da adopção ou abstenção de
condutas.
Este artigo agrupa as providências cautelares em 2 catogorias: as providências cautelares
antecipatórias[13] e conservatórias.
A cada uma está associado um regime específico. O Código não define em que é
que consistem umas e outras, cabe ao intérprete proceder à interpretação e à
determinação do sentido a dar a cada categoria para efeitos da aplicação do
respectivo regime. Segundo Freitas do Amaral[14] as
providências antecipatórias são aquelas que visam obter, antes que o dano
aconteça, um bem a que o particular tenha direito, ao passo que as providências
conservatórias são aquelas que se destinam a reter, na posse ou na titularidade
do particular, um direito a um bem que ele já disponha, mas que está ameaçado a
perder.
Atendendo ao artigo 114.º a
adopção de providências cautelares é solicitada em requerimento próprio. Há 3
hipóteses a considerar quanto ao momento em que se requere uma providência
cautelar: antes de ser instaurado o processo principal; juntamente com a
petição inicial; e já depois dela, durante a pendência do processo. Na primeira
hipótese, a providência cautelar assume a natureza de um processo preliminar,
autónomo, que depois será integrado no processo principal quando este vier a
ser instaurado, mas que cairá se o processo principal nunca vier a ser
instaurado. Se o processo já estiver instaurado, a providência cautelar assume
a natureza de um incidente no âmbito do processo principal.
Cumpre apenas fazer uma chamada
de atenção para a consequência atribuída à falta de oposição da entidade
requerida que culmina com a presunção de verdade dos factos alegados pelo
requerente – artigo 118.º n.º 1. Para o Professor Vieira de Andrade o ónus de
impugnação presente no processo cautelar deveria ser apenas um ónus de prova
material, sem prejuízo da livre apreciação, à posteriori, das provas pelo juiz[15].
Sobre os critérios gerias de
atribuição de providências cautelares é preciso fazer uma leitura cuidada do
artigo 120.º, nomeadamente, quando às suas alíneas b) e c) do número 1 e quanto
aos números 2 e 3.
Quanto à alínea a), do número 1
do artigo 120.º, apesar da sua colocação sistemática ele não prevê requisitos
de cujo preenchimento dependa, em circunstâncias normais, a concessão de
providências cautelares, mas pelo contrário, prevê que, em situações
excepcionais as providências cautelares possam ser atribuídas sem a verificação
desses requisitos – norma derrogatória.
Tal como sucede no Processo
Civil, o primeiro e mais importante critério de que depende a atribuição de
providências cautelares é o periculum in
mora e que segundo o artigo 120.º alíneas b) e c) existem quando “haja
fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da
produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente[16]” visa
assegurar ou pretende ver reconhecidos, consoante estejamos perante prvidências
do tipo conservatório ou antecipatório.
No entanto a redacção do artigo
381.º, número 1 do CPC é mais exigente ao falar de uma lesão grave e
dificilmente reparável, o que significa que, só serão aqueles que, pela sua
gravidade, a jurisprudência venha a selecionar para o efeito de considerar
dignos de tutela preventiva. O mesmo não acontece no âmbito do processo
administrativo.
A própria característica da
sumariedade e o facto de, em muitas situações, não ser possível especificar os
prejuízos em virtude de eles existirem apenas como uma ameaça ainda não
concretizada fazem com que a expressão “fundado receio” signifique que também o
juízo sobre a existência do perigo da constituição de uma situação de facto
consumada ou da produção de prejuízos de difícil reparação não tenha de ser um
juízo de certeza, mas apenas um juízo de probabilidade, que poderá ser maior ou
menor consoante as circunstâncias de cada caso. “ Um conhecimento completo e
profundo sobre a existência de um perigo pode exigir uma demora incompatível
com a urgência da medida cautelar[17]”.
Outro critério é aquele que se
refere à aparência de um bom direito. A atribuição das providências cautelares
depende de um juízo, ainda que superficial, por parte do juiz, sobre o bem
fundado da pretensão que o requerente faz valer no processo declarativo. Quando
está em causa a atribuição de uma providência conservatória, verificado que
esteja o periculum in mora, a
providência será concedida a menos que “seja manifesta a falta de fundamento da
pretensão formulada ou a formular ou a existências de circunstâncias que obstem
ao seu conhecimento do mérito”. O critério assume, neste caso, um papel
limitado, intervindo apenas numa formulação negativa: se não existirem
elementos que tornem evidentes a improcedência ou a inviabilidade da pretensão
material, não será por esse lado que a providência será recusada. No caso de
estar em causa uma providência do tipo antecipatório a providência só será
concedida quando seja de admitir “ que a pretensão formulada ou a formular pode
vir a ser julgada procedente”. Neste caso faz sentido aplicar os critérios
enunciados pela doutrina na apreciação do fumus
boni iuris, uma vez que estão em causa providências destinadas a alterar o statu quo. Se o requerente pretende que
as coisas mudem a seu favor sobre ele recai a prova do bem fundado da pretensão
deduzida.
Por último, e não menos
importante, surge o critério da ponderação de interesses. A atribuição da
providência não depende apenas dos dois critérios enunciados anteriormente. O
artigo 120.º, número 2 estabelece, ainda, que mesmo preenchidas as previsões
das duas alíneas a providência pode vir a ser recusada “ quando devidamente ponderados
os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultarem da sua
concessão se mostrem superiores àqueles que resultariam da sua recusa, sem que
possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências”. Não
basta um juízo absoluto, é necessário um juízo de valor relativo fundado na
comparação da situação do requerente com a dos eventuais titulares de
interesses contrapostos num juízo de prognóse – verdadeira ponderação de todos
os interesses em jogo. Vemos claramente a introdução do princípio da
proporcionalidade, na sua dimensão do equilíbrio, na decisão sobre a concessão
ou recusa da providência cautelar.
Não se trata de ponderar o interesse público
com o interesse privado, mesmo que muitas vezes o interesse do requerido seja o
interesse público e o interesse do requerente seja o interesse privado: o que
está aqui em conflito são os resultados ou os prejuízos que podem resultar para
os interessados na concessão ou na recusa para todos os interessados envolvidos
sejam públicos ou privados.
Outro aspecto é o da necessidade
e da adequabilidade da providência. A ideia de proporcionalidade não se
manifesta apenas na decisão da concessão mas também no que respeita ao seu
conteúdo. Desde logo, na dimensão da necessidade, as providências devem
limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente.
A lei do processo administrativo adoptou uma solução audaciosa ao permitir que
o tribunal adopte uma providência que não tenha sido requerida em cumulação ou
substituição daquela que foi requerida quando a medida seja adequada a evitar
ou atenuar a lesão do requerente e seja menos gravosa para os demais interesses
púplicos ou privados – temos uma derrogação expressa do princípio do pedido
susceptível de severas críticas mas que tem como objectivo uma tutela efectiva
adequada e equilibrada aos interesses em jogo.
A título de responsabilidade
lembrar que o artigo 126.º, número 2 prevê a responsabilidade civil do
requerente, que tem o dever de indemnizar os danos que eventualmente cause, com
dolo ou negligência grosseira, ao requerido e contra interessados, em especial
quando não haja decisão final de mérito no processo principal favorável ao
requerente.
Sobre o artigo 128.º, já
anteriormente referido, cabe explicitar melhor o seu regime, fazer uma ressalva
e chamar a atenção para mais uma novidade. Quando seja requerida a suspensão da
eficácia de um acto administrativo, a autoridade administrativa não deve
iniciar ou prosseguir a execução (quando recebido o duplicado do requerimento,
que é o mesmo que dizer quando citado nos termos do artigo 117.º). No entanto é
reconhecido o direito à autoridade administrativa, no prazo de 15 dias,
elaborar uma resolução fundamentada onde se reconheça que o deferimento da
execução seria prejudicial para o interesse público. A falta de resolução ou a
improcedência dos fundamentos usados faz com que a execução seja indevida.
A novidade prende-se com o facto
de o interessado poder requerer ao tribunal onde pende o processo de suspensão
da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de
ineficácia dos actos de execução indevida. Isto é, o tribunal competente para
decretar a suspensão da eficácia acto é também competente para declarar a
ineficácia dos actos de execução indevida, ou seja, dos actos de execução que
forem praticados contra o disposto na decisão judicial de suspender a eficácia
do acto.
A propósito do regime do artigo
128.º, coloca-se, desde logo, a questão da sua articulação com o instituto do
decretamento provisório de providências cautelares, que se encontra consagrado
no artigo 131.º [18].
Os dois regimes não se confundem.
Com efeito, a proibição de executar do artigo 128.º opera automaticamente, com
a recepção do duplicado do requerimento pela entidade requerida. A abrangência
(uma vez que abrange, nomeadamente, as situações que ficam de fora do artigo
131.º) e autonomia são características distintivas na medida em que a suspensão
opera extra-judicialmente, sem estar dependente da decisão do juiz.
No entanto, também o regime do artigo
128.º visa evitar o periculum in mora do processo cautelar prevenindo os danos
que para a requerente possam resultar da demora deste processo, através da
introdução de um regime que se destina a valer durante a pendência do processo
cautelar, até ao momento em que este venha a ser decidido. Seguem um caminho
diferente para o conseguir: no artigo 131.º pela concessão antecipada, a título
provisório, da providência cautelar e no artigo 128.º pela determinação da
produção automática de um efeito ex lege.
Para o Professor Vieira de
Andrade[19] a
existência do regime do artigo 128.º tem o alcance de afastar a possibilidade
do decretamento provisório da suspensão da eficácia de actos administrativos,
ao abrigo do artigo 130.º.
A controvérsia em torno do regime
do artigo supra enunciado não faz antever o melhor dos cenários, multiplicam-se
as vozes no sentido da sua eliminação[20].
Tendo em conta tudo o que ficou
acima escrito é possível verificar que a reforma se mostrou essencial no âmbito
da tutela cautelar e os particulares têm agora mais facilidade em aceder a uma
“arma” que pode paralisar a Administração Pública, apesar de todas as críticas
passíveis de emergir.
[1] Andrade,
José Carlos Vieira, Ajustiça Administrativa (2009), 11ª edição, Almedina,
Lisboa, pág. 300[2]No
comentário por mim realizado: “Os poderes de pronúncia do tribunal num novo
meio contencioso”[3] Artigo
268.º, n.º4 da CRP. A lei, em cumprimento estrito da CRP vem admitir
providências de qualquer tipo desde que sejam adequadas. Este fenómeno acabaria
por ser designado por Vieira de Andrade como uma “Universalidade de Conteúdos”
[4] Como
foi decidido, por exemplo, no T.A.F. de Coimbra, em 25/02/05, Proc. n.º
27/05.6BECBR, em que, tendo certa administrada requerido, contra a
Administração Regional de Saúde do Norte, a suspensão da eficácia de certo
despacho da Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo, não
autorizando a sua transição para lugar do quadro da Sub-Região de Saúde de
Santarém e, cumulativamente, a autorização provisória da tomada de posse do
referido lugar de quadro, se ajuizou nos seguintes termos, indeferindo-se o
pertinente pedido:
" Ora, o acto em causa, não autorizando a desvinculação da
requerente da Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo, e consequentemente
impedindo a ocupação do lugar em que foi colocada na Sub-Região de Saúde de
Santarém, deve entender-se como abrangido pela previsão contida na alínea b) do
n.º 1 do art.º 67.º do C.P.T.A. Nesta conformidade, analisando os termos em que
a requerente configura a relação material, afigura-se que a pretensão essencial
da mesma e objecto material do processo principal é a sua colocação na
Sub--Região de Saúde de Santarém, pelo que resulta que através da simples
anulação do acto administrativo em questão, esta não terá plena tutela da
pretensão subjacente, sendo que só através de um pedido de condenação da
Administração à prática do acto devido a sua pretensão virá a ser satisfeita. Ou seja, afigura-se que para a cabal satisfação
da pretensão (subjacente) da requerente, é necessária não apenas a simples
declaração de invalidade do acto administrativo praticado pela Coordenadora da
Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo em 6 de Dezembro de 2004, mas também a
prolação de acto(s) administrativo(s) que autorize a sua desvinculação, e que
admita a sua tomada de posse, face ao facto referido na alínea d) do
probatório, eventualmente a ser praticados por diferentes entidades
administrativas. No entanto, a requerente não refere que irá
formular, em cumulação com aquela pretensão impugnatória, o adequado pedido de
condenação à prática do acto administrativo devido. Ora, os processos cautelares destinam-se, antes
de mais, a acautelar a utilidade da sentença a proferir num processo que vise a
tutela definitiva de uma posição juridicamente relevante, sendo a sua principal
característica a instrumentalidade destes face aos processos principais a que
respeitem ( n.º 1 do artigo 113.º do C.P.T.A. e n.º 1 do artigo 383.º do Código
de Processo Civil ( C.P.C. ) ). (...) Há que ter em conta a
referida característica de instrumentalidade dos meios cautelares, que veda a
possibilidade de obtenção, através do decretamento de qualquer providência, de
vantagem ou benefício superior à que resultaria do total provimento da causa
principal. Com efeito, quando em sede de processos
cautelares se fala em instrumentalidade, há que distinguir a instrumentalidade
estrutural do processo, por um lado, da instrumentalidade substancial da
providência. É que a primeira reporta-se ao meio processual, ao processo
cautelar, e à sua dependência (instrumentalidade) e subordinação face ao
processo principal, e a segunda já respeita à característica e natureza
instrumental e provisória da providência cautelar, da concreta medida cautelar,
face ao pedido principal. (...) Ora, considerando que, nesta
situação, não basta que no processo principal se decida proceder à simples
anulação do acto para que os interesses alegados pela requerente possam ser
salvaguardados - pois é também necessária a eventual condenação da(s)
entidade(s) administrativa(s) a proferir o(s) acto(s) administrativo(s)
devido(s), de sentido contrário, autorizando a desvinculação da requerente da
Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo e sua tomada de posse na
Sub-Região de Saúde de Santarém -, é forçoso concluir que o requerente não
logrou demonstrar suficientemente a verificação da exigível instrumentalidade
deste processo face à pretensão a deduzir na sua causa principal. " [5] Num
breve texto (Cadernos de Justiça Administrativa n.º 34) em que Vieira de
Andrade fala sobre as novidades e inovações no processo cautelar com a reforma
de 2002 acaba por levantar algumas dúvidas e chamar atenção para alguns riscos.
Uma das muitas dúvidas prende-se com a rigorosa instrumentalidade a que esta
sujeito o processo cautelar. Nesse sentido o autor acaba por sugerir uma maior
autonomia “sobretudo quando a providência cautelar seja cumprida, se revele
suficiente na prática e todos se conformem com ela.”[6] Ao
contrário do que acontece em França com os processos de Référé[7]
Relativamente aos direitos, liberdades e garantias, não sendo suficiente as
providências cautelares poderá haver lugar a uma intimação urgentíssima para
obter uma decisão de mérito nos termos do artigo 109.º[8] Esta
sumariedade cognitiva, que se aceita por se tratar de uma medida não
definitiva, está naturalmente associada à urgência que é exigida pelo periculum in mora
[9] Contudo
o artigo 121.º do CPTA permite a convolação da tutela cautelar em tutela final
e urgente, através da antecipação, no processo cautelar, da decisão sobre o
mérito da causa, verificados que estejam os requisitos enunciados no artigo
referenciado.[10] Um
exercício interessante seria perceber quais as providências cautelares que se
podem ir buscar, de facto, ao Processo Civil para se aplicarem com as
necessárias adaptações ao processo do Contencioso Administrativo[11] Aquilo
que hoje se chama a proibição de executar um acto administrativo é a nova
designação para o velho instituto da suspensão da eficácia de actos
administrativos. Dessa modalidade ocupam-se os artigos 128.º e 129.º[12] Esta
foi também uma novidade, uma nova providência no contencioso, embora com
algumas limitações: apenas é possível a suspensão das normas que sejam de
aplicação imediata e com efeitos circunscritos ao interessado, salvo, é claro,
se o requerente for o Ministério Público, que defende o interesse geral –
artigo 130.º[13] Referir
apenas que antes da reforma de 2004 esta categoria não existia. Esta foi uma
grande alteração em matéria de justiça administrativa.[14]
Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 43[15] Cfr.
Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 34[16] Na
fórmula anterior poderia ler-se “prejuízo de difícil reparação”[17] Tiago
Amorim, “Apontamentos sobre as condições de procedência das providências
cautelares no novo processo administrativo”, Revista da Ordem dos Advogados,
Ano 63 (2003), pp. 415 e ss.[18] Também
apelidado pela doutrina de tutela cautelar de 2º grau, destina-se a evitar o
periculum in mora (possibilidade de lesão iminente e irreversível do direito,
liberdade ou garantia ou outra situação de especial urgência). Tem de ser de
tal forma qualificado que até a própria morosidade da providência cautelar é
posta em causa. Pode surgir como incidente na pendência do processo cautelar e
deve ser requerida pelo interessado.[19] Cfr.
Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, p. 371[20] Segundo
Mário Aroso de Almeida “ a eventual eliminação do regime do artigo 128.º, com a
recondução da tutela contra a morosidade dos processos cautelares dirigidos a
obter a suspensão da eficácia de actos administrativos ao instituto do
decretamento provisório das providências cautelares teria, pois, de passar pela
flexibilização dos pressupostos de que, nos termos do artigo 131.º, hoje
depende este decretamento, pelo menos para2011 o caso específico do
decretamento provisório da suspensão da eficácia de actos administrativos”
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