quarta-feira, 4 de abril de 2012

Os poderes de pronúncia do Tribunal num novo meio Contencioso – A Acção para a condenação à prática do acto devido

Os poderes de pronúncia do Tribunal num novo meio Contencioso – A Acção para a condenação à prática do acto devido[1]
A configuração do artigo 71.º do CPTA[2]
Este novo meio processual foi introduzido pela reforma do contencioso administrativo. Para uma melhor compreensão das suas (des)virtualidades  atenderemos sobretudo à elaboração doutrinal e ao seu propósito de forma a classificar os seus contornos, os limites e as diferenças de alcance em relação a outros meios contenciosos, quanto a um outro meio de acção, entepassada e conterrânea desta e que esta nova acção absorveu[3].
Estamos, agora, perante um contencioso renovado, com plena jurisdição do tribunal ainda que muitos não lhe atribuam senão um alcance limitado. A Doutrina, sempre generosa, atribuiu vários alcances[4] possíveis – um alcance médio, mínimo, máximo ou moderado.
Numa perspectiva de Direito Comparado, as acções para condenação à pratica do acto devido são diferentemente delimitadas na lei e o no seu manuseamento pelos tribunais, não suscitando dúvidas quanto as que a formulação da previsão de poderes de plena jurisdição do juiz da nova acção, no artigo 71.º n.º 1 e 2 do CPTA, permite.
Muitos foram os que não aplaudiram esta novidade, designadamente quanto aos amplos poderes do tribunal, fruto sobretudo de um excessivo enraizamento a um contencioso de anulação de cariz objectivo face a um subjectivismo que concede ilimitados poderes de plena jurisdição ao tribunal em nome de uma tutela jurisdicional efectiva – artigo 268.º n.º 4 da CRP.
De certo modo, esta nova acção, já teria surgido no imaginário de muitos, fruto das fragilidades[5] da acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido. O recuso contencioso de anulação era insuficiente na medida em que provocava um défice de tutela jurisdicional efectiva dos direitos dos particulares – a anulação não equivaleria à emissão do acto administrativo necessário ao particular, nem em virtude do processo de execução. Para muitos, a introdução de um novo meio que melhor tutelasse os particulares seria de saudar vivamente. Já para outros as possibilidades de evolução do contencioso administrativo português apresentavam-se como verdadeiros “Adamastores” cujas dúvidas, incertezas e preocupações são, hoje, novamente erguidas.
Mesmo que se passe da mera anulação do acto administrativo real ou fictício (artigo 109.º do CPA) à condenação da Administração o problema não desaparece totalmente: e se a Administração não executa a sentença ou, caso mais vulgar, a executa de uma maneira arrastada e incompleta? De facto, o processo de execução de sentenças, previsto nos artigos 5.º e 6.º do Decreto-lei n.º 256A/77, de 17 de Junho, transformava uma sentença formalmente anulatória, numa sentença de condenação com acções de indemnização acopladas. Mesmo a evolução preconizada hoje, comunga dos mesmos males anteriormente enunciados.
Será que é legítimo afirmar que o que se pretende no artigo 71.º do CPTA é a substituição do juiz à autoridade administrativa para uma tutela mais eficiente dos interesses dos particulares? Se assim for, teremos de repensar os esquemas clássicos da separação de poderes. O novo CPTA vem dar este arriscado passo ao permitir que um tribunal, através dos seus poderes de pronúncia, determine a prática do acto devido. Haverá um consenso claro quanto a um salto qualitativo no nosso contencioso administrativo[6]? Quais as virtualidades de tal solução quando se trata do exercício de poderes com amplo conteúdo discricionário[7]?
Em relação aos autores que estiveram por detrás da inspiração do CPTA e da sua versão final, não há dúvida de que tiveram em vista um importante e real acréscimo da protecção jurídica do cidadão. A dúvida reside, sobretudo, na real compreensão do poder discricionário da administração, designadamente quanto a encará-lo como um bem ou uma mais valia administrativa, de racionalidade teleológica privativa da administração activa, a qual é de exercer em benefício dos direitos dos cidadãos e do interesse público. Parece que assistimos não só na doutrina como na jurisprudência a uma vontade de restrição destes poderes pelo controlo jurisdicional.
As disposições legais transformaram o juiz em interprete privilegiado do que seja a juridicidade, em cada caso de exercício do poder discricionário pela Administração, e podendo ele, nesta acção para a determinação da pratica do acto devido, dar, sobre ela, directivas à autoridade administrativa. Estas directivas devem ser genéricas, sem determinação do conteúdo do acto administrativo[8]. O artigo 71.º n.º 2 quanto aos poderes de pronúncia do tribunal, dispõe que o juíz, não determinando o conteúdo do acto, todavia, deverá explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto devido. Quais os alcances dessas vinculações, ainda que genéricas, é que é a grande questão.
A novidade contida no artigo 71.º n.º2 prevê que o juiz, na acção para a determinação do acto legalmente devido (que tenha sido omitido, recusado ou recusada a apreciação do requerimento que o solicitou) e relativamente a um acto que envolva o exercício da discricionariedade, ou seja, na formulação legal, implique valorações próprias da função administrativa[9] deva na sentença explicitar as “vinculações a observar pela Administração”  ou, o que vai mais ou menos no mesmo, formular, como afirmava o projecto do CPTA, “as directivas de juridicidade do iter valorativo e cognoscitivo que conduz a decisão administrativa” sem no entanto estabelecer qual o conteúdo do acto. Tal prática, no limite, não será mais do que a determinação do conteúdo do acto. Mais, poderá ser atentatório do princípio da separação de poderes[10].
Em defesa da intervenção prevista para o juiz veremos que o objectivo não foi decerto, a ingerência nos poderes da administração mas apenas a pronúncia sobre a sua envolvência jurídica. Paradoxal é a afirmação de que o juiz pode indicar “…. O que considerar ser uma (ou mais do que uma) decisão respeitadora ou violadora dessas exigências legais”. A determinação na sentença dessa envolvência da decisão administrativa se não for um mero repetir da lei fazendo uso dos princípios jurídicos (o que para alguma doutrina não é o que se pretende[11]) com toda a certeza implicaram o determinar da própria decisão administrativa quanto ao essencial do seu conteúdo constituindo uma usurpação de poderes.
Tendo o legislador delegado em última instância o poder de decisão na administração tal tarefa insere-se no âmbito na sua reserva de execução[12].
Houve já quem equiparasse este fenómeno à autocontenção. Mas a autocontenção do juiz so faz sentido, em rigor, no quadro anglo-saxonico de indefinição da separação de poderes estaduais, a qual permite o exercício simultâneo por cada uma das funções estaduais de todas as outras, podendo, assim, aí, cada uma delas, autoconter-se em sentido próprio porque também podem exercer esse poder. Não é esse o entendimento europeu continental da separação de poderes nem, por seu lado, o entendimento relativo à função de um tribunal administrativo no controle da actividade administrativa. Tal construção da autocontenção tem sido usada no âmbito das construções teóricas que no espaço germânico se inseriram no clima de forte restrição da discricionariedade administrativa, quais a doutrina da margem de liberdade ou folga de apreciação afirmando-se aí a vinculação legal de princípio da decisão e a competência do juiz para, nesses casos, dizer o direito em ultima instância.
Teríamos aí a competência das competências do juiz em que ele se poderia autoconter, dadas as dificuldades praticas do controle jurisdicional da aplicação administrativa de alguns conceitos indeterminados e a necessidade imposta pela natureza das coisas, de garantir flexibilidade à administração.
Atrever-nos-íamos a dizer que, se este é o contexto teórico em que se insere a disposição do CPTA com o qual se pretenderá assegurar a definição pelos juízes dos termos supostamente jurídicos em que deverão ser entendidos e aplicados conceitos jurídicos indeterminados e, também restringir o âmbito das autorizações de discricionariedade. A invocação que eventualmente se fizesse da autocontenção seria a demonstração acabada da convicção que não podemos evitar de que se quer restringir também por esta via, o poder discricionário da autoridade administrativa, no seu exercício que afecte os cidadãos.
O artigo 71 significa uma ilimitada confiança na função jurisdicional e nas suas capacidades de orientação directa da acção administrativa em relação a um caso concreto de decisão devida e não apenas de controlo externo, o que, em matéria de exercício de discricionariedade administrativa, se não justifica. Tal levará a uma prática eliminação da discricionariedade[13] em que os tribunais seriam os paladinos da jurisdicidade do Estado de Direito em defesa dos direitos dos cidadãos.
Seria bom que não se temesse apenas o arbítrio administrativo e se tivesse a devida consciência de que se pode estar a substitui-lo pela possibilidade de um arbítrio à posteriori do juiz.
Vários são os casos na jurisprudência quer portuguesa quer estrangeira em que se reduz a zero a discricionariedade o que significa que em acções de condenação o juiz exerce plenos poderes de jurisdição e interpretando o direito, ou seja, as vinculações a observar pela administração, naquele sentido restritivo em que foram compreendidas no âmbito de uma simples acção de impugnação. Esta última hipótese ao permitir a substituição no decidir do caso pelo juiz, ainda nos parece mais duvidosa, por se transferir claramente para o tribunal, a autoria da decisão administrativa que apenas virá confirmar o previamente por ele definido. Há que atender aos custos inevitáveis decorrentes, em última análise, a pretexto de uma maior protecção dos direitos dos cidadãos.
O procedimento da decisão discricionária implica sempre a reconstrução administrativa da hipótese da norma legal habilitante e, aí, nessa norma, poderão estar envolvidos conceitos indeterminados, ou faculdades de acção expressamente contidas na estatuição dos preceitos legais. A autoridade administrativa irá completar a previsão legal com os pressupostos adicionais necessários à dedução do resultado jurídico.
Este processo decisório poderá transformar normas atributivas de discricionariedade, com a expressão “pode” em normas imperativas do tipo “deve”.  Razão pela qual, não fará sentido que o juiz escolha qual a solução de entre várias, a melhor do ponto de vista político-administrativa.
A formulação de pressupostos adicionais pela autoridade administrativa para “fechar” em casa caso o tipo legal, é orientada pelos princípios[14] jurídicos gerais da actividade administrativa. Estes princípios funcionam como directivas da discricionariedade, as quais, não são mais do que isso, apenas directivas resultantes de uma autovinculação administrativa que deve deixar ao seu destinatário alguma capacidade de autodeterminação.
Não é possível permitir ao juiz que formule directivas neste domínio uma vez que a aplicação dos princípios implica também discricionariedade, não sendo o resultado certo, líquido ou objectivamente unívoco. Se o juiz assim o fizer, estará, nos termos vistos, a decidir ele discricionariamente o conteúdo do acto, substituindo-se no procedimento decisório discricionário à autoridade administrativa desrespeitando a vontade da lei.
Em conclusão, o artigo 71.º n.º 2 será uma contradição nos seus próprios termos. A verdade é que ou o juiz não estabelece as directivas de juridicidade ou nem todas as vinculações a observar no acto pela administração e assim não se pronuncia sobre o conteúdo do acto predominantemente discricionário, ou estabelece aquelas directivas e vinculações e com isso pronuncia-se vinculativa e concomitantemente sobre o conteúdo do acto no que ele tem de essencial.
Talvez por isso mesmo o legislador, no texto do artigo supra referido, tenha preferido empregar a designação de “vinculações a observar”, aparentemente de conteúdo mais objectivo, em vez da expressão directivas de juridicidade, como constava do projecto do CPTA que implicaria uma maior genericidade e subjectividade. Parece, contudo, que o resultado não é muito diferente.
O juiz terá de limitar-se apenas a uma condenação genérica. Apesar das fragilidades que ela possa suscitar ou até mesmo da sua utilidade[15]. Do ponto de vista legal o desejável é que o juiz fixe, na acção de condenação parâmetros a observar pela Administração no reexercício do seu poder discricionário. O tribunal deve limitar-se a traçar os limites que o dever de não reincidir nas eventuais ilegalidades cometidas projecta sobre o reexercício do poder, estabelecendo as modalidades que ficam vedadas à Administração – alcance negativo da sentença, projecção de um efeito preclusivo.
Em geral, os tribunais podem controlar o exercício do poder discricionário através de directivas internas que visem disciplinar o exercício do poder discricionário. Os juízes podem mesmo exigir o respeito dessa directiva de discricionariedade em casos de evidente semelhança, por força do respeito do princípio da igualdade e do respeito pela autoridade competente para a sua própria autovinculação. As directivas são normas internas indicadoras do sentido da decisão mas só nos limitados termos de uma também limitada vinculação, condicionada esta à não alteração das circunstâncias que possam vir a impor uma alteração do programa administrativo de execução da lei a que aquelas directivas se referem.
É possível admitir que o tribunal venha impor, à autoridade administrativa decisória, de modo positivo, o respeito pelas suas próprias directivas de discricionariedade internas, dele conhecidas desde logo através da fundamentação do acto discricionário no quadro do princípio da igualdade. Transpondo este raciocínio para a formulação do artigo 71.º, n.º2, o tribunal poderia facilmente repescar a directiva usada nessa fundamentação para controlar o acto e a sua fundamentação – eficácia externa das directivas orientadoras da discricionariedade.
Contudo, as directivas administrativas, são, em princípio, internas, não tendo eficácia externa por si mesmas mas apenas mediata e o tribunal só as poderá conhecer, adoptar e impor como parâmetros a observar pela Administração por via do princípio da igualdade. Quanto a directivas genéricas que dos outros princípios gerias pudessem resultar e ser tidas em conta na sentença e de seguir pela Administração, sua avaliação exige de igual modo discricionariedade com que o tribunal só poderá conhecê-las indirectamente através da eficácia externa dos princípios em causa, através da fundamentação do acto administrativo.
Estas maiores subtilezas na apreciação que os tribunais façam dos actos administrativos de exercício do poder discricionário e do respectivo uso sem vícios pode não ser compatível com as formulações do artigo 71.º n.º 2.
Por outro lado, é certo, também, que poderá considerar-se apenas a hipótese de estar em causa aí a afirmação do “direito” dos tribunais indicarem como devem ser preenchidos os aí ditos conceitos indeterminados, que suporiam um preenchimento valorativo em relação ao qual o juiz formularia directivas de juridicidade. Directivas que o tribunal entendesse valerem aí como resultado de vinculação por ele interpretada.
Se se quiser atribuir algum sentido positivo ao artigo supra enunciado então a solução correcta nas hipóteses de discricionariedade seria ter um direito/pretensão a obter um acto expresso de exercício sem vício da discricionariedade. Uma tal importação da dogmática e prática alemãs exigem uma maior clarificação sob pena de uma incorrecta aplicação no ornamento jurídico português.
Ainda que, de certa forma, se corra o risco de ainda estarmos perante uma substituição, uma vez que o acto discricionário não é programável pelo juiz, mas só pela lei e pela Administração, sendo muito difícil conceber que se possa pedir a sua emissão de uma determinada forma.
Em todo o caso, determinada pretensão subjectiva, relacionado com igual direito subjectivo público à igualdade de tratamento, reconduziria sempre a um exercício sem vícios do poder discricionário – Jurisprudência e doutrina alemãs.
Na Alemanha, a acção de condenação só é admissível em caso de existir poder discricionário se o particular invocar em juízo que houve mau uso ou uso indevido da discricionariedade pela Administração ao recusar praticar o acto favorável. Os imperativos da reserva de lei em termos de densidade são menos intensos deixando mais espaço para uma normação administrativa técnica inevitável, onde relevarão para além dos regulamentos também as directivas administrativas internas de discricionariedade, que podem ser conhecidas externamente, desde logo, através do princípio de igualdade, exigindo à Administração que as respeite garantindo o uso sem vícios de poder discricionário e igualdade de tratamento.
Atendendo aos quadros germânicos, a única forma de dar um sentido útil ao artigo 71.º, n.º2 seria fazer prevalecer uma interpretação clarificadora, correctiva e precisadora com remissão para alguma autovinculação administrativa em geral conhecida e praticada. O acto discricionário permite vinculações possíveis que não são claras nem líquidas nas normas habilitantes, uma vez que a Administração está sujeita a um princípio geral de juricidade e é a ela que cabe a tarefa da interpretação. A Administração cria direito, decide com intencionalidade jurídica no exercício da sua função mas a medida dessa juricidade não é totalmente justificável sob pena da anulação da divisão de poderes e competências operadas pela lei. 
Terá o juiz de actuar aí com cuidado e poderão mesmo levantar-se dúvidas quanto à legitimidade de colocar nas mãos do juiz a clarificação das vinculações não totalmente expressas, ainda que em todo o caso afirmadas pela via indirecta da vinculação oferecida pela igualdade de tratamento.   
Em suma, o cidadão não tem perante a Administração um direito subjectivo público material a obter um determinado resultado ou decisão com um determinado conteúdo, mas apenas um tal direito formal a que a autoridade Administrativa decida sem vícios e com respeito pela igualdade de tratamento.  




[1] Experiências estrangeiras: Verpflichtungsklage, que de algum modo serviu de modelo à nossa acção de condenação à prática do acto devido, e a Leistungsklage alemãs, ou a acção de cumprimento perante a omissão (recours en carence) do direito comunitário, ou as actiones di condonna do contencioso italiano, ou mesmo o pouvoir d’injonction em França.
[2]  Código de Processo nos Tribunais Administrativos
[3] A acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido
[4] Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 3ª edição, Coimbra, 2000, pp. 142 e ss., para quem se justifica atribuir na interpretação da lei, conjugada com o princípio da tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente consagrado, a este meio contencioso de acção um alcance médio, alternado para os perigos de uma teoria de alcance máximo, que poderia deslizar para uma subversão do sistema de administração executiva, pondo em causa a autonomia e a estabilidade do acto administrativo.
[5] Estando o particular cada vez mais dependente de actos administrativos favoráveis, de prestação ou, em geral, ampliativos dos seus direitos e interesses, a recusa da Administração em praticá-lo ou o seu silêncio perante solicitação, segundo Sérvulo Correia, colocam o particular numa situação delicada, para a qual os meios de tutela existentes na generalidade dos ordenamentos, principalmente se ligados ainda às estruturas básicas do contencioso de anulação, não providenciam a adequada defesa, já qua a própria anulação de decisão negativa da Administração não equivale à emissão do acto administrativo necessário à expansão do interesse legítimo e portanto à satisfação da pretensão.
[6] Vasco Pereira da Silva, no seu manual, parece saudar a evolução do nosso contencioso. “ O tribunal vai, pois, para além do acto, não se contando com a formal apreciação da existência de um acto administrativo de rejeição liminar, nem se limitando pura e simplesmente a mandar praticar um acto qualquer, constando a simples existência de uma omissão configuradora da violação do dever de decidir, antes devendo proceder a um juízo material sobre o litigio, julgando à cerca da existência ( e do alcance) do direito do particular e consequentemente determinando o conteúdo do comportamento da Administração juridicamente devido”
[7] Para Maria Francisca Portocarrero é justamente a determinação do conteúdo do acto pelo juiz, quando haja poder discricionário que é passível de contestação porque como afirma a autora nesses casos a determinação do conteúdo “não é juridicamente devido”.
[8] Vasco Pereira da Silva afirma o poder do juiz de impor à Administração a prática de um acto administrativo e com um determinado conteúdo, na medida em que estejam em causa escolhas que são da responsabilidade da Administração, mas que o tribunal, mesmo assim, deve indicar a forma correcta do exercício do poder discricionário, no caso concreto, estabelecendo os limites e os alcances das vinculações legais, assim como fornecendo orientações quanto aos parâmetros e critérios da decisão. Este autor faz uma comparação com as sentenças indicativas do direito alemão. A crítica que lhe é feita é que as sentenças indicativas de que fala, respeitam realmente o poder discricionário das autoridades administrativas. 
[9] Na expressão que era usada no projecto, “ … acto que envolva o exercício de discricionariedade ou preenchimento valorativo de conceitos indeterminados”.
[10] Segundo Gomes Canotilho, a garantia autónoma de um “núcleo essencial de competências” para cada um dos poderes aponta para a ideia de ordenação dos órgãos de soberania pautada pela adequação orgânica, pois as medidas e decisões dos poderes devem ser adoptados previamente pelos órgãos que, segundo a sua organização, função atribuição e procedimento de actuação estão em melhor posição para analisar os pressupostos, os juízos e os resultados indispensáveis a medidas ou decisões constitucionalmente ajustadas.
[11] Segundo Vasco Pereira da Silva para além de o juiz ordenar a prática do acto, ele deve proceder também à conformação do comportamento devido pela administração, delimitando aquilo que é vinculado e o que é discricionário, e fornecendo indicações quanto ao modo correcto do exercício do poder discricionário.
[12] Reserva da administração como limite jurídico aos poderes de pronuncia do tribunal, na perspetiva da pretensão condenatória
[13] Relembrando mais uma vez que quando o legislador previu uma decisão administrativa discricionária o fez por considerar que seria esta que estaria em melhores condições de decidir.
[14] Máxime a imparcialidade, igualdade, proporcionalidade, justiça e legalidade
[15] Mário Aroso de Almeida, Comentários ao Código (…), pp.365 e ss.: “ O artigo 71.º, n.º2, não tem, pois, a pretensão de dizer a que é que o tribunal pode e deve condenar a Administração a cada caso, mas apenas o propósito de estabelecer um conjunto de parâmetros ou de linhas orientadoras, identificando o tipo de situações com que o tribunal se pode ver confrontado quando for chamado a condenar a Administração à pratica de um acto administrativo.”

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